ENTREVISTA, PARTE I - Congolês lembra os anos no Dragão e a forma como conquistou o seu espaço e nunca mais o perdeu. Elogios vincados ao treinador; Central recorda a passagem pelo FC Porto, onde foi orientado por um treinador que resiste à saída porque se sente em casa. Da parceria com Pepe aos elogios a Otávio e a Uribe, o defesa abre o livro a O JOGO.
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Figura destacada do Marselha, comandante imperial desde a chegada, o congolês Mbemba teve um rendimento extraordinário na época de estreia em França, após quatro realizadas no FC Porto, onde capitalizou as qualidades com Sérgio Conceição nas três últimas. O central tem, por estes dias, somado honras como foram a presença no onze do campeonato francês, tendo ainda sido eleito o melhor jogador africano no campeonato mais abundantemente concorrido por jogadores do continente. O último diploma foi o de embaixador do futebol congolês, atribuído pelo presidente Félix Tshisekedi, num encontro em Kinshasa, com o acréscimo de ser um louvor inédito.
Aos 28 anos, Mbemba comprovou toda a clareza do seu jogo, compromisso espartano e uma regularidade inabalável, mesmo nos intervalos mais críticos do coletivo.
As saudades do Porto são reais, embora tenham sido um pouco esbatidas pela atmosfera de Marselha, cidade igualmente apaixonante e fervilhante com uma devoção ao futebol difícil de igualar em França. Na primeira entrevista desde que abandonou Portugal, o congolês é direto e incisivo, como, aliás, foram sempre os seus desempenhos.
Essa grande época no Marselha, com 45 jogos, um total de 7 golos no melhor registo da carreira, fez esquecer o FC Porto ou ainda há uma marca forte do antigo clube?
-São, antes de mais, dois clubes diferentes e com visões também diferentes. Mas em termos de competitividade, posso dizer que o Marselha é do mesmo calibre do FC Porto e temos uma atmosfera no Velódrome altamente calorosa. São adeptos incríveis, há uma cidade inteira que vive para o clube. No Porto era algo semelhante, não posso dizer que fiquei a perder. Em nada!
De que forma as épocas no FC Porto contribuíram para o jogador que se apresentou em França, mesmo levando a vantagem de uma adaptação facilitada pela língua?
-Quando lá cheguei é certo que poucos me conheciam e ficaram surpresos por eu me ter imposto imediatamente na equipa de um grande emblema francês. Devo agradecer muito ao presidente do Marselha, que é espanhol e me falou do quanto acompanhava o campeonato português. Ele sabia do que era capaz! Trabalhei muito e conquistei o meu lugar. Estou numa equipa que tem muita visibilidade e muita divulgação em África. Isso mudou o meu prestígio. Tinha de provar o meu valor pelos meus compatriotas e não consigo descrever o orgulho de ter sido o melhor africano da Liga. É fantástico! Até porque fui o primeiro defesa a ganhar o prémio Marc Vivien Foé. Terminei na equipa do ano e os sete golos são a cereja no topo do bolo.
Como resume a passagem pelo FC Porto?
-Foi um trajeto muito rico profissionalmente e pessoalmente com campeonatos e duas dobradinhas. Vou guardar sempre uma memória muito boa e uma grande gratidão ao treinador, presidente e a todos os adeptos. A minha mulher e os meus filhos sentem muitas saudades da vida em Portugal.
E para o Mbemba, como foi ponderar o futuro e decidir pela saída?
-Foi bastante difícil porque jogar por um clube durante quatro anos é forte e deixa sempre laços sentimentais. Mas como sou muito competitivo, decidi que era hora de colocar a mim mesmo um novo desafio.
Depois do início muito difícil que teve no FC Porto, numa época com muito poucos jogos, passámos ao Mbemba autoritário que nunca saiu da equipa nas três épocas seguintes. Que imagem tem do comando de Sérgio Conceição?
-É verdade que me lesionei com gravidade ao chegar para a primeira temporada e tive de trabalhar mais ainda para conquistar o meu lugar. Voltei antes da data marcada, não me quiseram dar chances, diziam que devia esperar pela temporada seguinte para me impor. Acabei por jogar três ou quatro jogos na equipa secundária, mas tive de dizer ao treinador que não podia jogar mais ali. Conversei com ele cara a cara, disse que não ia deixar de lutar e ele prometeu lutar por mim. E deu-me uma oportunidade finalmente! Quando isso aconteceu nunca mais perdi posição até ao meu último dia no FC Porto. O que mais gosto no Sérgio Conceição é essa ideia de trabalho, de privilegiar quem tanto se esforça. E ele é o exemplo, trabalha mais do que os jogadores. Corria connosco e estava habitualmente na frente. Ele dá tudo o que tem e exige o mesmo. Isso é impressionante nele, é um verdadeiro apaixonado. É muito competitivo, nunca se cansa de ganhar, luta por tudo. Adoro o seu estado de espírito.
Consegue ver Conceição fora do FC Porto, a treinar em França, por exemplo? Falou-se que esteve na lista do PSG...
-Ele conhece bem o campeonato francês porque trabalhou no Nantes. Acho, portanto, que é algo que pode acontecer e ele ser bem sucedido.
É caso para os adeptos temerem quando chegar o dia da sua saída?
-Eu acho que ele resiste e não sai porque está bem no FC Porto. Temos de perceber que ele é português e está no seu país, em casa estamos sempre bem. A certeza que tenho é que, um dia que tiver de sair, claro que deixará um grande vazio no FC Porto, mas sairá pela porta grande, tendo marcado para sempre a história do clube.