ENTREVISTA, PARTE I >> Hugo Oliveira chegou em dezembro ao Famalicão e levou a equipa ao 7.º lugar da I Liga, o que serve de motivação para a nova época. Está de corpo e alma num trabalho que ultrapassa as quatro linhas
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O arranque do campeonato convoca sempre boas sensações aos treinadores e Hugo Oliveira não foge à regra. Em entrevista exclusiva a O JOGO e ao Zerozero, o técnico demonstra toda a ambição que carrega neste desafio de consolidação pessoal e do clube em Portugal.
O Famalicão arranca para o campeonato fiel aos seus princípios, com alinhamento entre presidente e treinador. Com um plantel muito jovem, o objetivo passa por crescer todos os dias.
A época está a começar. Como correu a fase de preparação?
—Correu de forma positiva, ou seja, a trabalhar as nossas ideias de jogo, os nossos sentimentos enquanto coletivo e os nossos princípios enquanto clube. É óbvio que saímos beneficiados pelo facto de já virmos com alguns meses de trabalho em relação à época passada e também o facto de mantermos alguns jogadores em relação ao último ano é uma vantagem.
O crescimento do Famalicão é visível também nas condições que criou. Tendo vindo de Inglaterra, está impressionado com o que encontrou?
—O projeto do Famalicão tem uma ligação que vai muito para além da equipa A. Este clube é um encaixe perfeito comigo, foi isto também que me motivou a aceitar este desafio. É um clube ambicioso e moderno, mas também humilde e muito trabalhador. Depois de alguns meses da época passada em que conheci tudo internamente, desenvolvemos ideias e, este ano, com a força do presidente, da administração e da Direção desportiva, encaramos o futuro com otimismo. É muito bom haver esta comunicação também com os sub-23 e com a academia. Este ano vamos dar um passo ainda mais forte. Nesta altura, vamos ter um grupo de jogadores que, sem importar o escalão, podem estar nos sub-19, nos sub-23 ou na equipa A. Vão saltar de treino para treino. A ideia é vivermos todos da mesma maneira, com os mesmos princípios e modelo, aquilo é o jogar à Famalicão. Temos de falar todos a mesma língua. Todos têm de estar preparador para o presente e para o futuro, numa ligação que abrange áreas tão vastas como a performance, a nutrição, a parte social, emocional, técnica e de desenvolvimento. Os jogadores que andam nesta forma híbrida, de saltar de escalão para escalão, têm de saber que vivem no modo Famalicão. E, por isso, vão estar preparados para agarrar a oportunidade para quando ela chegar. Queremos que o futuro do clube esteja dentro de portas, preparar o amanhã com o trabalho de hoje. Aqui não conta só o resultado. Há um ideia que vai muito mais além disso.
É utópico pensar em melhorar o 7.º lugar da época passada?
—O futebol é rendimento e o rendimento está ligado ao resultado. Nesta casa ninguém tem mais fome ganhadora do que eu. A ideia que fomos construindo no ano passado, e o presidente e a estrutura já traziam de anos anteriores, é que devemos ser sempre melhores. O amanhã tem de ser melhor que hoje. Nesse sentido, desenvolver jogadores é fundamental. Se os jogadores forem melhores, a equipa vai ser melhor. E se a equipa acreditar nas ideias do treinador, o amanhã vai ser melhor. Aquilo que prometemos e somos obrigados é que vamos tentar fazer melhor a nível de classificação e pontuação. Mas isto é uma forma de estar que temos de viver internamente. Não pode ser só conversa. Por isso temos de viver diariamente com essa fome. Os jogadores têm de ter talento e fome de quererem ser melhores. Os resultados vão ser a soma da nossa competência. O campeonato vai ser extremamente competitivo e nós cá estaremos para dar a nossa resposta.
Perdeu Mihaj, Sejk e Topic. Como é que o Famalicão olhou para o mercado neste defeso?
—Acima de tudo, sendo coerente com aquilo que eu pensava, com a preparação do futuro, sem nunca descurar a questão do rendimento. Muitos dos jogadores que chegam vêm com esse sentimento de poder fazer parte desta versão híbrida em relação aos sub-23. Outros já têm um bocadinho mais de experiência, embora a maior parte das contratações tenha 19 ou 20 anos. A média do plantel anda à volta dos 22 anos, o que não quer dizer que não estejamos abertos a jogadores mais maduros. Queremos é talento. Temos de ser uma equipa esfomeada, com uma forma de viver vincada.
“Fundamental jogarmos com 12”
No ano passado teve estes registos: cinco jogos sem sofrer golos, melhor defesa da história do Famalicão, segunda melhor posição de sempre na I Liga, ano de 2025 sem derrotas em casa. Como dar continuidade?
—No ano passado, não estávamos a ser tão fortes em casa, mas em janeiro isso inverteu-se. Houve trabalho emocional nesse sentido e uma conexão muito grande para começarmos a jogar com 12. É fundamental que o Famalicão jogue com 12. O Famalicão é um clube moderno, com propriedade internacional, uma administração profissional e um presidente de alto nível. Mas é, sobretudo, um clube de sentimento, que começa e acaba no adepto. Por isso, foi fundamental que todos entendessem a forma de jogar da equipa. Tudo começou em Braga, num jogo emotivo, que terminou 3-3. Depois, foi a partir de momentos difíceis que fomos ao encontro dos adeptos, sempre fruto da crença dos jogadores. O culminar foi o jogo em casa também com o Braga, em que os adeptos jogaram connosco. Foi um jogo a sério e verdadeiro, aqueles que as pessoas conseguem ver os 90 minutos, o que é difícil nos dias de hoje. Aí, senti que os adeptos estavam a jogar connosco, tudo encaixou. A premissa é sempre esta: jogar com 12 em casa e capitalizar a ligação com os adeptos já na estreia. No futebol diz-se que o passado é museu, mas não acredito nisso. Os jogadores sabem que não podemos esquecer o que está para trás, não podemos esquecer o que foram aqueles tempos sem ganhar em casa, nem o modo montanha-russa em que o clube vivia. Mas também não podemos esquecer a forma como mantivemos o momento que nos levou a estar cinco jogos sem sofrer golos e a marcar em tantas jornadas seguidas.