"Hoje é fácil dizer que estamos démodé", afirma o treinador dos sub-23 do Sporting
ENTREVISTA - Alexandre Santos, técnico dos sub-23 do Sporting, lamenta comparações com formação do Benfica e garante futuro com a base na Academia.
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O convite, a adaptação, a mensagem de Varandas e o verde no horizonte. Eis Alexandre Santos em exclusivo.
Vamos ao início: como surgiu a chance de treinar os sub-23 do Sporting?
-Há uns anos, com outras pessoas aqui dentro, houve a possibilidade de trabalhar no escalão de juniores. Desta vez, foi tão simples quanto isto: pessoas da estrutura de futebol do Sporting, como Paulo Gomes, Hugo Viana e Luís Vidigal, perguntaram-me se estava interessado, se queria integrar a segunda equipa do futebol profissional, numa relação estreita com quem lidera e numa perspetiva de fazer crescer os jogadores - já profissionais - para níveis que lhes permitam chegar à equipa principal. Não serem só promessas, mas a concretização dessas promessas. Foi atraente por ser o Sporting, mas também pelo profissionalismo, pela exigência, pela equipa que vinha treinar. E aceitei.
Tornou-se mais fácil dirigir os sub-23 após a experiência ao serviço do Estoril?
-A vantagem é precisamente essa, o facto de ter estado noutra equipa de sub-23, de conhecer muito bem a Liga Revelação, o que é este tipo de equipa. Nos últimos 10, 12 anos, trabalhei com outros jogadores, mais adultos, de equipa principal. Obrigou a que me adaptasse a uma nova realidade. Já havia alguns seniores, mas são todos muito jovens.
"Estou envolvido a 200%. Sei que existe talento e que há jogadores para subir à equipa principal"
A formação é uma das grandes apostas da liderança de Frederico Varandas. O que é que o presidente lhe pediu?
-Os sub-23 são a segunda equipa do clube e, num instante, pelo processo profissional onde se inserem, podem tornar-se jogadores da equipa principal. Curiosamente, abordaram-me dois dias antes da receção ao Vorskla, onde três jogadores da minha equipa foram utilizados: o Thierry Correia, o Miguel Luís e o Bruno Paz. Tinha a garantia de que vinha para um grande clube, mas também para uma equipa totalmente profissional - era isso que queria. Não quero, com isto, dizer que não há um papel formativo, mas os sub-23 têm de estar mais próximos da equipa principal do que a formação; os jogadores têm de estar muito aptos para aparecer na equipa principal. O presidente disse-me: "Quero que o que se faz nos sub-23 seja melhorado." Até porque a equipa vinha de um período bastante instável. Era preciso dar um rumo coletivo à equipa e que essa equipa pudesse evoluir, também na classificação da Liga Revelação. Era importantíssimo ficar nos seis primeiros lugares da prova e poder jogar o play-off de campeão, onde há uma competitividade muito interessante.
O Sporting é terceiro neste momento. Quão importante é vencer esta prova?
-Faz todo o sentido vencer, pela cultura e exigência do clube. Não me foi exigido, mas eu próprio disse que quando entrasse, o meu objetivo seria ganhar todos os jogos e chegar ao primeiro lugar. Isso obriga-nos a sermos mais exigentes connosco, a ensinar os jogadores a lutar por algo. Era preciso revitalizar a ambição de ganhar a Liga Revelação, também para tirar o melhor dos jogadores. Não podemos, contudo, estar só preocupados em ganhar, pois se assim fosse não aconteceriam determinadas situações, como jogadores nossos serem chamados à equipa A - e aconteceu com o Thierry Correia, com o Abdu Conté e com o Bruno Paz.
Pinta-se nos bastidores uma crise na formação. É um cenário real?
-Hoje é fácil dizer, perante as formações de Benfica e Sporting, que uma está na moda e outra está "démodé". Aqui, as pessoas querem trabalhar para melhorar os recursos humanos, e se há um vazio de talentos... É natural que aconteça, uma vez que houve desinvestimento durante alguns anos. Estou envolvido a 200% neste projeto, tenho muito com que me preocupar e o que sei é que nos sub-23 existe talento, que continuam a haver jogadores a sair para a primeira equipa.
ELVES BALDÉ É UM EXEMPLO E MATHEUS NUNES... A CERTEZA
Eis a análise - minuciosa - dos nomes mais mediáticos da sua esfera... e outros por quem, provavelmente, não daria assim tanto. Gonzalo Plata, assume, pode iniciar a competição na formação que comanda.
O empréstimo é um "tentáculo" importante para os sub-23? Falemos de um exemplo: Elves Baldé, com 19 anos, iniciou a época nos sub-23 e está, hoje, a lutar pela subida com o Paços de Ferreira.
-O caso do Elves é o de alguém que tem qualidade, maturidade e competitividade. Está numa equipa que disputa a subida de divisão e esse é um bom espaço para evoluir, dar o salto. O Paços não se compara a qualquer equipa da Liga Revelação. Se joga mais? Depende do treinador, pode não jogar tanto como aqui... Vai beneficiar com algumas coisas, mas não vai beneficiar em outras. Foi um caso de interesse por parte do Paços e o Sporting percebeu - bem - que tinha a ganhar. Tem é de jogar cada vez mais, pois só assim fará parte da equipa principal.
A chegada de Matheus Nunes para os sub-23, ex-Estoril, tem o seu crivo?
-Conheço-o desde setembro. No Estoril, treinava na equipa principal, mas jogava comigo. Sabia, quando cheguei, que o Sporting estava a acompanhar o seu percurso. Perguntaram-me, falámos de quem era, em processo de treino e de jogo, e eu dei uma opinião muito positiva. Tem uma característica muito interessante: não tendo uma base formativa de "grande", demonstra qualidades de quem tem muito e bom processo de treino. Sai de dentro dele. Se subir ainda mais o nível, será um jogador de destaque. Não tenho dúvidas de que pode chegar à equipa principal e com legitimidade para ser titular.
"Na América do Sul joga-se muito com bola. Plata tem de ser muito mais do que isso"
Gonzalo Plata: os sub-23 serão o primeiro passo?
-Pode, a qualquer momento, e se a equipa principal assim o entender, integrar os sub-23 para ter uma adaptação mais rápida, jogando - é o mais provável. Mas neste momento é um jogador da equipa principal. Na América do Sul, joga-se muito mais com bola e muito menos sem ela. O Plata tem de ser muito mais do que isso. Tem qualidades técnicas indiscutíveis, mas ainda está num processo de adaptação.
Como comenta a falta de minutos de David Wang?
-É um extremo de 2000 e na posição onde atua há jogadores mais maduros. Pode começar pelos juniores, mas espero uma resposta em 2019/20.
"CAMINHAMOS PARA VOLTAR A TER EQUIPA B"
Projeto esteve perto de regressar com Cintra, mas iria, sempre, reiniciar na terceira divisão.
O Sporting caminha para voltar a ter equipa B?
-Sabemos que uma equipa B dá mais um espaço para jogadores, já seniores, estarem, por exemplo, numa segunda liga, uma oportunidade única para crescer. É um espaço com qualidade para crescer melhor do que a Liga Revelação, ainda que este seja outro bom espaço. Há margem de progressão, o nível é elevado. As equipas também não têm sobre elas o problema da descida...
... e isso faz falta?
-Claro que faz. Nada na vida é perfeito. A II Liga não tem o que a Liga Revelação tem e vice-versa. Com boas condições competitivas, os clubes devem ter equipa B e sub-23. Não duvido, por isso, e perante a nossa atual política, que caminhamos nesse sentido.