Adeptos e críticos apontam falhas do presidente na gestão de quase todos os vetores do clube e a queda é um cenário, garantem, cada vez mais real.
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Aperta-se o cerco a Frederico Varandas, presidente do Sporting cada vez mais fragilizado num clube já de si fraturado.
Eleito em 2018 após um dos momentos mais negros da história do emblema centenário, o antigo diretor clínico dos leões é pressionado de dentro e de fora, fruto do rumo, sobretudo, no principal motor do clube, o futebol - eis a principal crítica, entre outras, apontadas por antigos dirigentes leoninos, num raio-x feito a O JOGO.
O líder leonino garantiu recentemente que conseguiu a salvação de um clube à beira do precipício quando tomou posse e várias vezes referiu a temporada 2018/19 como a melhor dos últimos tempos graças à conquista de dois títulos (Taça de Portugal e da Liga). No entanto, nenhum deles satisfaz a massa adepta e a crítica que ambiciona mais, nomeadamente a conquista do título nacional que foge desde 2001/02... e o regresso à Champions. Dificuldades financeiras, na comunicação, falha no cumprimento das promessas eleitorais e divisões na família leonina são os principais motivos apontados a um presidente jovem que pegou num "monstro" e agora se vê cercado por todos os lados. Pese embora as dificuldades persistam, é mesmo numa das áreas mais complicadas que mais obra feita vai mostrando: a financeira. As exigências para um cargo desta dimensão provam ser demasiadas aos olhos da crítica especializada em dirigismo no universo verde e branco, com a tónica a residir ainda no facto de Frederico Varandas não se encontrar rodeado das pessoas indicadas... ou mesmo de, quando as tem à sua volta, de não ouvir os seus conselhos e recomendações, como poderá suceder na comunicação.
Futebol afunda o clube
No futebol, vetor fundamental para o clube e principal sustento de todo o edifício leonino, o insucesso e a rota descendente estão à vista. O Sporting perdeu a Supertaça com uma goleada (0-5) no dérbi com o Benfica, já foi afastado da Taça de Portugal por uma equipa do terceiro escalão (Alverca) e acaba de falhar a Taça da Liga às mãos do Braga, além de que está a registar os piores números de sempre na Liga: nunca perdeu tanto em Alvalade na primeira volta e vai no pior registo de sempre (está a 19 pontos do Benfica e mais perto dos lugares de descida).
A estratégia desportiva no futebol, o posicionamento no mercado, a política de contratações e a falta de profissionais maduros e com provas dadas, são aspetos visados pelos analistas. Varandas vai no quarto treinador em ano e meio (Peseiro, Keizer, Leonel Pontes e Silas), procedendo a contratações sem rendimento (Vietto parece, pelos números, ser a exceção e Fernando até já foi devolvido), que tiraram espaço à aposta na formação. Resiste à venda - necessária financeiramente - de Bruno Fernandes, optando por saídas polémicas dos jogadores em seu redor (como Bas Dost ou Raphinha) e de talento aproveitável (Matheus Pereira, Domingos Duarte ou Daniel Bragança, por exemplo). O plantel ficou desequilibrado (só um ponta de lança até à chegada de Sporar há poucos dias) e perdeu qualidade e capacidade competitiva em relação aos rivais. Tudo isto leva ao distanciamento dos lugares cimeiros e dos muitos milhões da Champions.
Jogadores sem confiança no departamento clínico
O departamento médico e a tão autoelogiada Unidade de Performance, menina dos olhos de Frederico Varandas, liderada por Francisco Tavares (já perdeu por motivos pessoais o fisiologista iraniano Alireza Rabbani), têm suscitado várias dúvidas: a demora nas recuperações de Ristovski e Jovane são um exemplo, Battaglia e Bas Dost recorreram a especialistas no estrangeiro, e Leonel Pontes chegou a afirmar que "teve" de tirar Vietto na derrota com o Famalicão por recomendação clínica, quando o 10 estava a ser o melhor em campo e sentia-se apto a continuar a ajudar a equipa.
Finanças, tábua de salvação
Na área financeira, fruto do trabalho de administradores especialistas na matéria, o perdão de parte da dívida pelos bancos e a intervenção, mesmo que escassa, do Fundo Apollo para resolver problemas de tesouraria prementes, são notas positivas para a administração, embora suscitem reações diversas. O Sporting prepara-se também para consumar a reformulação do acordo-quadro da reestruturação financeira, o que poderá aliviar a responsabilidade diária de tesouraria, enquanto continua a pairar no ar - sugestões de ex-dirigentes - a hipótese de perda da maioria da SAD.
Da comunicação à bancada
Na área da comunicação, o início do mandato foi nomeado como confrangedor. A dificuldade em expressar-se em entrevistas e de passar a mensagem adequada fez mossa nos primeiros tempos. Varandas já mudou de empresa de comunicação (da LPM para a Wisdom Consulting, além de ter contratado, também, outros nomes para aumentar a nomenclatura de uma área nevrálgica).
Por último, mas não menos importante, a relação com os adeptos, em particular com claques e núcleos. No que às primeiras diz respeito, a guerra está à vista, a subir de tom e a chegar... ao Governo - diga-se, por intervenção da SAD. Embora muita gente lhe reconheça a coragem de ter suspendido os protocolos com Juventude Leonina e Directivo Ultras XXI, outros preferiam uma postura conciliadora e dialogante que evitasse o descalabro em que se tornou esta cisão. E sem vitórias... já não são só as claques que se viram ao presidente.
Presidente aos olhos de antigos responsáveis leoninos
O JOGO falou com quatro ex-dirigentes de vários quadrantes do Sporting, que apontam defeitos e virtudes da gestão do atual líder
Simões de Almeida, área do futebol
"Tem sido um horror, o presidente tem tido um papel controverso e os resultados não são bons; tem de vender forçado e não tem para comprar. O panorama é desolador, está a começar uma fase tenebrosa. As culpas não são todas dele, mas o que se vê é muito mau. A gestão do mercado de transferências foi muito má, com má escolha de contratações. Não se percebem as trocas de treinadores e Silas nem tem habilitações. Não luta por coisa nenhuma."
Jesus Oliveira, área financeira
"Conseguiu algum perdão dos bancos e redução significativa das responsabilidades, mas se o futebol não está bem, não há dinheiro. Por isso, é inevitável vender Bruno Fernandes e achei reprovável pensarem em aumentar os ordenados dos administradores. Quanto à solução através do Fundo Apollo, será um empréstimo na mesma, pelo que o melhor seria com avais pessoais. Importa é salvaguardar o património e o capital da SAD."
Carlos Severino, área da comunicação
"O lado desportivo depende muito da comunicação, de estimular a equipa e de criar esperança nos adeptos. Não gosta de ser atacado e aplica defesa atacando, quando a filosofia da sua campanha eleitoral foi unir. E não o consegue, nem passar a mensagem. Trabalha com empresas de comunicação, que por norma não conhecem o meio, e no futebol a comunicação não é a conveniente. Falta força e eficácia na estratégia de comunicação. Será que não ouve os ex-jornalistas ao seu lado? Pecou também porque não soube ser cuidadoso em não criar a expectativa do título. E até a luta contra as claques joga contra ele."
Menezes Rodrigues, área de núcleos e claques
"Alcochete deixaria sempre marcas e depois de uma época difícil, que correu bem, esperava que continuasse assim. As mudanças de treinador foram péssima ideia, o futebol profissional tem de ser para profissionais maduros e não pode ser para experimentalismos e rapaziada a ver se dá nas vistas, e as contratações não foram felizes. Com as claques esteve bem, exigente, mas podia ter negociado para afastar só os mal comportados e encontrar um modelo de convívio. Dos núcleos não oiço aplausos, são a bandeira ao longo do país e é preciso alguém maduro para lidar com eles, promover contacto e estimular os mais novos pelo país fora."