Os antigos árbitros Jorge Coroado, José Leirós e Fortunato Azevedo fazem um primeiro balanço ao desempenho da arbitragem na I Liga.
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Os especialistas do Tribunal O JOGO, Jorge Coroado, José Leirós e Fortunato Azevedo, são unânimes ao considerarem que o setor da arbitragem nas competições profissionais está aquém do desejado. E não são meigos nas suas sentenças para com os juízes de relvado nem para os que funcionam na estrutura da vídeoarbitragem.
"Falta coragem para decidirem quando surgem incidências para punir irregularidades, sobretudo dos grandes."
Jorge Coroado considera, por exemplo, que a cooptação de árbitros despromovidos para o VAR é um "ato de menoridade intelectual, gesto de puro corporativismo". Por sua vez, José Leirós é da opinião de que "há um problema ao nível dos árbitros portugueses de relvado e é por isso que UEFA e FIFA não os têm nomeado para grandes jogos ou fases finais de clubes e seleções.
Por fim, Fortunato Azevedo avisa: "O sinal vermelho está aceso e quem comanda o futebol deve tratar de eliminar os árbitros que, nos últimos anos, estiveram associados a momentos tenebrosos ou situações menos claras." Confira a avaliação, em forma de depoimento, hoje efetuado por cada um deles.
QUE BALANÇO FAZ DA ARBITRAGEM ESTA ÉPOCA
Jorge Coroado
VAR minado por corporativismo
"Efetuar balanço sobre arbitragem faltando três jornadas para final de época não se afirma extemporâneo. Do cômputo global resulta, notória, a degradação da qualidade e da competência dos quadros, algo que a adoção da tecnologia (VAR) veio exaltar. Não há árbitros de geração espontânea. Há gente que evidencia qualidades e apetência para o cargo, porém tem de ser trabalhada, ensinada e devidamente enquadrada, preferencialmente por quem sabe, deu provas e possa ter sido exemplo ou referência.
"Quem era fraco como árbitro, sê-lo-á enquanto VAR"
Porque os quadros da "academia" não sabem sequer a frente do apito e, quando ouvem que a bola pincha, assustam-se, a arbitragem enferma de défice de transmissão de conhecimento e competência. Mais que decorar o código do jogo e normas regulamentares, importa ter sensibilidade para a função, conhecer a génese da modalidade e sobretudo praticar muito, falar e aprender com todos.
Cooptar para VAR elementos despromovidos ou convidados a acabar a carreira é ato de menoridade intelectual, gesto de puro corporativismo. Quem era fraco como árbitro, sê-lo-á enquanto VAR. Enquanto a "amigocracia" e o nacional-porreirismo prevalecerem sobre a meritocracia, o sector jamais se afirmará como independente e autónomo."
José Leirós
UEFA e FIFA nem os nomeiam...
"Esta época não correu nada bem, com diversas reclamações de clubes, adeptos e dirigentes, que não acreditam na arbitragem portuguesa. Esta falência não se deve apenas a uma dúzia de erros colossais em jogos grandes, mas também a dúzia e meia que ocorreram noutros jogos em que não estiveram Benfica, FC Porto ou Sporting.
"Tem havido a ilusão do profissionalismo dos árbitros, que não o têm sido"
Há um problema ao nível dos árbitros portugueses de relvado e é por isso que UEFA e FIFA não os têm nomeado para grandes jogos ou fases finais de clubes e seleções. Dá-se muito relevo quando estes são chamados para VAR em compromissos internacionais, mas o foco deveria estar nos melhores a apitar no relvado. Aliás, a respeito do VAR, analisa-se mais o acerto do protocolo do que as decisões. Há muitas pessoas da estrutura da arbitragem a encher o peito e a dizer que o protocolo não permite isto ou aquilo, esquecendo-se de ver se houve ou não erro.
Nos últimos dois anos, FPF e Liga fizeram um grande investimento financeiro no VAR e nas deslocações dos árbitros, mas tem havido a ilusão do profissionalismo dos árbitros, que não o têm sido, nem na ótica da profissão nem nas decisões competentes. Foi pena terem terminado com as comissões técnicas, que traziam experiência, e o defeso deve ser aproveitado para uma reflexão, ou no próximo ano estará tudo na mesma..."
Fortunato Azevedo
Gritante falta de qualidade
"Pelo desempenho até este momento, conclui-se, em primeiro lugar, uma gritante falta de qualidade da maior parte dos árbitros que apitam na I Liga e uma falta de coragem para decidirem quando surgem incidências para punir irregularidades, sobretudo dos grandes, em claro prejuízo dos clubes mais pequenos.
"Quem decide precisa de procurar a ordem no meio do caos"
Quem decide precisa de procurar a ordem no meio do caos, ordem que se impõe a quem, como os árbitros, tem a difícil tarefa de tomar decisões para que estas sejam justas. Só assim estaremos a contribuir para uma maior credibilidade do futebol. Tudo isto aponta no sentido de se tornar imperioso acabar com a competição sem regras e as apostas obscuras em pessoas que não reúnem qualidades, nem têm conhecimento pela prática adquirida ao longo dos anos. O sinal vermelho está aceso e quem comanda o futebol deve tratar de eliminar os árbitros que, nos últimos anos, estiveram associados a momentos tenebrosos ou situações menos claras.
Sobre o VAR, considero-o, indiscutivelmente, a melhor ferramenta ao dispor dos árbitros, mas apostar em juízes despromovidos por falta de competência ou coragem é um sinal de corporativismo que não credibiliza o sistema, nem a verdadeira justiça pretendida."