"Em 2012 estive no Porto e os táxis ainda paravam. E já tinham passado 40 anos..."
Estreou-se pelo FC Porto contra a CUF, hoje conhecida apenas por Fabril, no Estádio Alfredo da Silva. Antes do reencontro entre clubes, na Taça de Portugal, O JOGO conversou com Teófilo Cubillas.
Corpo do artigo
A visita do FC Porto ao Fabril do Barreiro [depois de amanhã, 14h30] serviu de mote para o contacto com Teófilo Cubillas, "Nené" como era conhecido. O antigo craque peruano, figura incontornável do futebol português, tem lugar na história do mítico Estádio Alfredo da Silva, onde os portistas começam a defender o título da Taça de Portugal.
13043979
Foi lá que, em fevereiro de 1974, a poucos meses da revolução da Liberdade, se estreou de azul e branco num empate a zero. Lembra-se? "Da estreia muito bem, do clube e do estádio nem por isso. Como disse que se chama o clube com quem o FC Porto vai jogar? Fabril? Fabril, Fabril...Não...", respondeu, contactado por O JOGO no passado domingo. "Ah, chamava-se CUF? Então sim, lembro. Era uma das boas equipas do campeonato português na altura. Bem, continuo sem me lembrar se foi contra essa equipa que me estreei, mas lembro-me da maneira como me receberam. Foi lindo. Querem falar sobre isso? Terei todo o gosto. Ligue-me, por favor, terça-feira pela hora do almoço. Estarei em casa [em Miami, Estados Unidos] e posso falar com calma. Vamos precisar de horas...", sugeriu. Terça, às 14 horas em ponto locais, o antigo astro peruano contactou-nos por whatsapp. "Cheguei. Pode ligar agora mesmo". Assim foi. Não foram horas, mas faltou pouco. Cubillas deu-nos 1h30 do seu tempo e o que disse pode ler a seguir.
Vamos então começar com a estreia. Foi por isso que o contactámos...
- Pode ser. Mas seria bonito começarmos pelo dia em que eu cheguei ao Porto. Foi lindo, lindo, lindo. Nunca me esqueço nem me canso de recordar. Não imaginei ser possível. Eu era apenas um menino que jogava futebol. Hoje em dia isso não aconteceria.
"Seria bonito começarmos pelo dia em que eu cheguei ao Porto. Foi lindo, lindo, lindo. Nunca me esqueço nem me canso de recordar"
Também pode ser, embora não seja propriamente uma novidade...
- Sabia que os adeptos contribuíram para o FC Porto poder pagar a minha transferência [5600 contos, mais de um milhão de euros nos dias de hoje, à luz da inflação]? Só soube já perto do final da minha permanência. Nunca saberei como lhes agradecer.
Contam os relatos que lhes agradeceu do aeroporto às Antas...
- Acenei a todos. Foi uma receção muito especial. Em todo o trajeto havia pessoas a levantarem-me a mão. Viverei eternamente agradecido. E acho que quem esteve nesse caminho também não se esquecerá. Acredita que, em 2012, quando estive no Porto para se homenageado [pelo ISMAI], quando passeava na rua ainda havia pessoas a cumprimentarem-me? Alguns táxis paravam. E já tinham passado quase 40 anos...
Voltando à estreia, com a CUF, que agora é Fabril. Que memórias tem?
- Muito poucas, para dizer a verdade. Lembro-me que o jogo não era nas Antas e que estava muita gente à minha espera, mesmo sendo rival. E fui aplaudido e senti-me realmente importante. Depois lembro-me de ir lá para dentro e sei que não marquei, porque o meu primeiro golo foi com o Beira-Mar. Mas pouco mais. Para ser honesto, joguei tantos, mas tantos jogos, que não me lembro assim de tantos. Só os do Mundial e os mais decisivos, principalmente os de 1970 [terceiro melhor marcador, atrás de Muller e Jairzinho].
Nem dos FC Porto-Benfica?
- [Risos] Esses sim, claro, até porque o meu amigo Eusébio estava do outro lado. Era um tremendo amigo, uma tremenda pessoa. Como jogador não vale a pena falar. Sempre que nos encontrámos, saudámo-nos com carinho. Senti muito a sua partida. Mas voltando a esses clássicos, marquei logo no primeiro que fiz. Com as Antas a abarrotar, penso que o Flávio fez o 1-0 [na verdade foi Abel], Eusébio empatou e, na segunda parte, eu marquei o 2-1. Loucura. Estávamos naquela fase em que ganhávamos em casa e perdíamos quando íamos à Luz. O Benfica ainda era o dominador, mas estávamos cada vez mais próximos.
"Envio um abraço a Pinto da Costa. Não é fácil alguém estar há tanto tempo a liderar um clube e ganhar tantas vezes"
Chegou a dizer, numa entrevista, que só não foi campeão em Portugal porque havia Eusébio..
- Não foi bem isso que disse. O Benfica tinha outros grandes jogadores. Simões, por exemplo. Era a base da tremenda Seleção que em 1966 surpreendeu o mundo. Por falar nisso, apreciava muito o Torres, também. O Benfica jogava bem, era o melhor na altura. Mas o FC Porto estava a crescer muito, a montar uma grande equipa, com os miúdos Oliveira e Gomes a aparecer. E estava, acima de tudo, a convencer-se de que poderia ser maior. Penso que se tivesse ficado mais tempo, acabaria por ser campeão. O FC Porto foi e cumpriu o que já pensava na altura, começou a ser ganhador. Por falar nisso, envio um abraço ao seu presidente [Pinto da Costa]. Não é fácil alguém estar há tanto tempo a liderar um clube e ganhar tantas vezes. Recebeu-me com muito carinho em 2012. Fiquei muito sensibilizado. Foi incrível comigo e tenho muita gratidão. Agradeci imenso por ter o meu lugar no Museu. Caramba, não é para todos...
Já pensou em regressar para visitar o Museu?
- Claro que sim. Era uma das coisas que estava nos meus planos antes da pandemia, ir ao Porto e rever amigos. Mas algumas pessoas já começam a viajar. Há menos de um mês, um amigo peruano visitou o estádio e o museu e enviou-me uma fotografia da minha estátua. Partilhei logo com os meus filhos.