Declarações de Eduardo Luís na sede de campanha de André Villas-Boas, candidato à presidência do FC Porto, na tertúlia "Conversas à moda do Porto”
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O que foi mais difícil? O Bayern ou tirar a taça ao João Pinto? "Sempre fui muito crítico na situação do final do jogo, em que todos ganhámos o troféu e parecia, na altura, que só um jogador tinha ganho... Se fosse hoje, se tivéssemos ganho a Taça dos Campeões com 60 anos ele não teria feito aquilo. Foi uma atitude de alguém que estava muito contente. Perdoo o João Pinto, mas acho que nem toquei na Taça. Só no avião, talvez... O Bayern foi complicado. Mas jogou-se bem, de 0 a 10, todos nós levámos 11. Foi histórico e, para mim, é uma vaidade enorme. Nesta altura, na altura parecia só mais um jogo. Só alguns anos depois percebemos que tínhamos ganho algo muito importante para o FC Porto. É um prazer ir na rua, alguém falar connosco e recordar essas vitórias."
Importância da vitória: "O FC Porto ainda não tinha vencido nada e, agora, já ganhou muito. Sentimos o orgulho de termos dado o pontapé de saída para muitos sucessos europeus que orgulham todos os portistas. Na segunda parte podíamos ter marcado muitos mais golos. Tivemos Madjer, Juary... Várias situações para poder golear o Bayern. Teria sabido ainda melhor. Mas fizemos um grande jogo, todos estivemos muito concentrados. A equipa era construída por grandes valores, que hoje poderiam valer muitos milhões ao FC Porto. O André sempre foi um esteio no meio-campo, o Sousa, se não ficou surdo com o apito final, pouco faltou... O Jaime Magalhães fez um excelente jogo. Fez muitas faltas, foi agressivo, o árbitro não fez por dar muitos amarelos, deixou o jogo andar. Muito há para dizer, mas o que se passou foi o pontapé de saída para as vitórias que vieram depois."
Chegada ao FC Porto: "Eu vou para o FC Porto do Marítimo, era para ter vindo dois anos antes, mas o chamado 'verão quente' abortou essa vinda. Aconteceu em 1982. Tive a vantagem de já conhecer os meus colegas da Seleção de esperanças, o Sousa também. O FC Porto estagiava em Lisboa no mesmo hotel do Marítimo. Muitas vezes, tínhamos refeições juntos, não havia ali problema nenhum. Foi nessa altura que o Pedroto me abordou para vir para o FC Porto. A minha adaptação não foi difícil. Nunca fui indiscutível, mas ocupava a lateral-esquerda, fazia de central à direita e à esquerda..."
Jogo de Tóquio e dificuldades com o terreno: "Em boa verdade, nós até já estávamos habituados. [risos] O relvado do Estádio das Antas, quando chovia, era uma desgraça. Até cheirava mal! Tinha lama, não havia as condições que o FC Porto tem hoje. Nós só tínhamos dois campos."
Passado e presente: "As condições de trabalho são diferentes, os valores são diferentes... Mas tendo em conta as dificuldades que havia no nosso tempo... Nós raramente víamos vídeos de equipas contra quem íamos jogar. Não havia muita informação. Era o treinador, o adjunto e o preparador físico. Mas éramos muito inteligentes a jogar. Mesmo sem muita informação em relação aos adversários, éramos muito inteligentes. Queríamos treino conjunto, porque o resto era treino físico, correr na praia, correr em sítios onde não se jogava. A forma de treinar mudou muito desde os meus primórdios. Por vezes eu penso: como é que estes jogadores jogam à bola? Pela forma como se posicionam, as entradas ríspidas sem necessidade nenhuma... Foi um prazer jogar no FC Porto e jogar com estes jogadores. Não eram jogadores bons, eram jogadores com classe. Eu sabia que o meu colega não ia perder a bola se lhe passasse. Havia mais qualidade técnica nos jogadores. O Beckenbauer era de uma classe... Eu, como miúdo, tentava imitar e foi isso que fiz. A minha qualidade técnica melhorou porque, se calhar, treinava em casa. Só comecei a jogar futebol aos 15 anos, não é como hoje, que estão na barriga da mãe e já jogam à bola. Hoje, se um miúdo não for jogador de futebol... Ai dele."
Conselhos aos jovens: "Os miúdos de hoje começam a jogar muito cedo e cabe, não só aos pais, endereçá-los para os sítios certos. E lá é preciso haver pessoas que saibam lidar com a malta nova. Uma atitude negativa ou uma frase que não caia bem no momento certo pode deitar a perder toda a vontade que o miúdo possa ter para jogar futebol. Eu tenho essa experiência. Os treinadores, professores nas camadas jovens, têm a responsabilidade de orientá-los de forma a serem, em primeiro lugar, boas pessoas, bons estudantes e bons atletas. E fazê-los entender que o futebol é uma grande profissão, mas também uma maneira de encarar a vida de forma a sermos não só grandes desportistas, mas também pessoas de bem."