Karoglan e Drulovic fugiram da guerra, lutaram pela sobrevivência e fizeram-se reis no futebol português. Olhar ao Braga-Gil Vicente por um croata e um sérvio, que conquistaram amor nos guerreiros e nos galos
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Antecipar um Braga-Gil Vicente é uma viagem obrigatória ao início dos noventas, pois os dois clubes receberam aqueles que foram dois dos jugoslavos mais duradouros e bem-sucedidos no futebol português. Consensuais no respeito que impingiam, monumentais no futebol que fabricavam, um mais mortífero a finalizar, outra verdadeira lenda das assistências, senhor de pura geometria. Não foram propriamente amigos, não se falavam e até se picaram alguma vez, nervos à flor da pele, num contexto em que a guerra nos Balcãs dividia etnias, culturas e até irmãos de vida. Com uma temporada de diferença, da Croácia chega Karoglan, da Sérvia, Drulovic. Marcantes como poucos, prolongaram a sua arte e frieza durante épocas, o primeiro chegando de Chaves a Braga, o segundo de Barcelos às Antas, tendo Drulovic sido peça icónica dos dragões, protagonista integral do Penta. Mas foi o Adelino Ribeiro Novo a primeira morada do genial extremo, que até decidiu um jogo em Braga em 1993.
"Marquei um belo golo com a parte fora do pé esquerdo. Acho que foi uma assistência do Tuck. O Braga tinha uma excelente equipa com Rui Correia, José Nuno Azevedo, muitos duelos tive contra ele, Toni, Forbs e Fernando Pires, treinada pelo Vítor Manuel mas nós estivemos muito bem", recorda Drulovic.
Karoglan, autor de 65 golos em 212 jogos pelo Braga, fez também, muito naturalmente, a diferença em embates contra os galos, tendo o croata boas memórias na cabeça. Marcou por três vezes ao Gil Vicente, uma delas num 4-1, no 1º Maio. "Recordo-me perfeitamente desse jogo, pois acredito que marquei o meu melhor golo em Portugal, foi um vólei ao Vital. Tenho como um dos meus momentos preferidos. O Gil Vicente era um clube pequeno e amigável mas nós, nessa época, não éramos maiores nem melhores, porque estávamos a lutar para não ser despromovidos", relembra Karoglan, reconhecendo a oposição forte gilista. "Tinha um grande treinador que era o Vítor Oliveira. Veio um bom jogador, que foi o Drulovic. Muitos jogadores vinham da Jugoslávia nesse período, porque o nosso campeonato tinha sido interrompido pela guerra. O que existiu entre nós hoje fica para trás. Acredito que fomos os dois melhores em Portugal", acrescenta o croata. O sérvio faz o mesmo exercício de memória e também agarra o impacto de Karoglan. "Foi um jogador muito importante para o Braga e acho que conseguimos deixar uma marca forte no futebol português. Também começou num clube mais pequeno, no Chaves, eu fui do Gil Vicente para o FC Porto. Lembro o Karoglan de vários jogos, mas nunca falávamos pelo tema da guerra. Houve um incidente num jogo da Taça, que se resolveu", relembra Drulovic.
O antigo craque da seleção sérvia curva-se ao crescimento dos guerreiros. "O Braga subiu muito em resultados e infraestruturas, aproximou-se dos três grandes. Ainda me lembro que tive oportunidade de jogar lá, depois de sair do Benfica, mas não deu certo. Vejo um excelente clube que representa muito bem Portugal na UEFA. Mas o Gil também tem melhorado as suas condições, tem por hábito boas equipas e faz boas vendas. Será um jogo dividido, é um pequeno dérbi do Minho onde os jogadores sempre se querem mostrar", avisa Drulovic. Karoglan reconhece o peso acrescido ganho pelos bracarenses no panorama nacional e uma condição superior que ele não chegou a gozar. "Agora luta todos os anos pelos lugares de topo e qualifica-se sempre para a Europa. Isso é uma grande diferença...", demonstra.
"Fran foi bom reforço"
Com um avançado como Fran Navarro, Karoglan elogia a nova alma predadora no ataque do Braga, sabendo a importância de chegar com créditos já evidenciados dentro da mesma Liga. "É sempre melhor quando te reforças com alguém que já joga o mesmo campeonato, porque o jogador já chega adaptado, sabe o que é jogar em casa e fora. Mesmo não sendo caro ou conceituado, se marca golos pode render dinheiro. O Fran Navarro tem-se mostrado um bom jogador, foi um bom reforço e é um tipo de alvo difícil de atingir. Espero que o consiga em definitivo e ainda possa ganhar dinheiro com ele. Jogadores que não dão certo nos grandes, costumam dar em Braga", atira.
"Racic depressa estará no seu melhor"
Drulovic, por sua vez, coloca em análise o regresso de Racic aos guerreiros. "Teve esta oportunidade de voltar, foi importante para ele. Tem de lutar para ser titular, por ter o seu espaço. Existe sempre muita concorrência no Braga, não será fácil, mas é um atleta experiente que já passou por vários campeonatos. Vamos ver rapidamente Racic no seu melhor e jogando será mais uma aposta para a seleção. Espero que a sorte o acompanhe", destaca, não esquecendo Gordic, guarda-redes sérvio que suspira por chance em Barcelos. "É talentoso mas para uma guarda-redes é sempre mais complicado esperar. Depende das oportunidades e do que vai ser capaz de fazer. Está num excelente clube, eu sou o exemplo do que ele pode alcançar na carreira. Se não fosse o Gil Vicente, não sei como teria sido a minha carreira. E nunca esquecerei o que devo ao Vítor Oliveira, um grande amigo que me faz falta."