Domingos Paciência: "Recebemos uma família ucraniana com uma criança autista. Resta rezar para que passe..."
O treinador Domingos Paciência participou esta quinta-feira num webinar organizado pela Liga Portugal
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A Liga Portugal e a Fundação do Futebol, em parceria com o SJPF, APAF e ANTF, convidaram o treinador Domingos Paciência para um fórum no qual se debateu a importância e o papel do futebol na luta pela igualdade. Durante o webinar, que marca o início da campanha "Racismo Não", que vai decorrer durante toda a 27ª jornada da Liga Bwin e Liga SABSEG, a discriminação no futebol, as experiências noutros países, o conflito na Ucrânia e a experiência pessoal dos intervenientes estiveram em cima da mesa.
Sobre o racismo: "No futebol convivi com vários jogadores de cor negra, de várias religiões, mas nunca assisti a nenhum preconceito com qualquer uma dessas pessoas. Vamos assistindo a estas situações no dia a dia, mas são situações que, devido à sua dimensão, hoje tocam a todos e gostava que todos olhassem para esta grande máxima: só existe uma raça que é a raça humana."
Futebol como desbloqueador: "Não podemos confundir, porque existem dois tipos de adeptos. Uns que amam e vivem o futebol de uma forma apaixonada e com alegria e que vivem o espetáculo que o futebol tem de ser e outros, que não veem nada disso, só veem frustração e outros sentimentos, ou outros comportamentos impróprios do futebol. Enquanto todos os adeptos não se consciencializarem que este tipo de comportamentos são completamente o inverso do que o futebol é, só vão conseguir estragar esta grande festa que é o futebol. Claro que existem culturas diferentes, mas, infelizmente, são estes adeptos com este tipo de mentalidades que estragam e fazem com que o espetáculo do futebol não seja a festa que tem de ser. Sempre entendi o futebol como uma paixão e sempre ouvi dizer que o futebol é o sonho, alegria, emoção e não uma indústria. Infelizmente existem pessoas que passam esta fronteira e extravasam as suas frustrações e raiva nessas atitudes e comportamentos."
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Culturas diferentes: "Não daria um episódio de discriminação, mas sim de aceitação. Quando estive no Kayserispor, a sexta-feira era sempre o dia sagrado na religião muçulmana e sabia que neste dia tinha de coordenar os treinos de maneira diferente. Sabia que tinha sete jogadores que tinham de sair a determinada, e como treinador tinha de me ajustar a eles. Não me criou nenhum impacto, pois sabia que era mais importante e temos de respeitar as orientações das pessoas, aceitá-las e criar um ambiente estável e de harmonia."
Falta de proximidade: "Se recuarmos há uns anos concluímos que o futebol precisa urgentemente de se aproximar dos adeptos. Eu vejo quando abrem as portas do estádio ao domingo parece o dia D para eles. Há uns anos abriam-se as portas do treino e a proximidade que tinham com os adeptos era diferente, eles "viviam" todas as emoções, cresciam desde jovens a estarem próximos com as equipas, com a paixão do futebol. Acho que falta esta proximidade, ações de solidariedade, os jogadores têm de sair, eu lembro-me que em vários países os jogadores iam ter com as crianças, com os jovens que são o futuro do futebol".
Guerra na Ucrânia: "Infelizmente está a acontecer esta mesma discriminação que também falamos aqui. As mulheres e crianças estão a sair e os homens ficam na Ucrânia e logo aí é uma discriminação. Talvez os russos que estão a combater estejam contrariados e só estão por uma pessoa que assim quis! Há um risco muito grande de a humanidade entrar numa grande guerra! Eu também estou a viver tudo isto porque recebemos uma família ucraniana com uma criança autista e é muito complicado gerir tudo isto. Só nos resta rezar para que passe."
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