Um gin caro a João Mendes e Moutinho e um convite ao falecido para subir ao palco e cantar uma morna. Breve conversa com Filipe Palas, dono do Sé la Vie em Braga e Jorge Lopes, proprietário do Oub'Lá, que até vai buscar o nome a um tema de banda de Braga: os míticos Mão Morta. Braga e V. Guimarães defrontam-se domingo
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Brutal gatilho de emoções, dínamo de sentimentos por cidades, festim para os adeptos, cada dérbi pelo mundo tem um rasto de energia, calor e pólvora...difícil de quebrar ou atenuar. No Minho aceleram-se batimentos cardíacos entre guerreiros e conquistadores, Braga espalha o seu clamor, Guimarães dobra a sua ardência apaixonante. O pulsar de cada cidade desemboca na noite, no frenesim, na pressão da hora do jogo e tudo se extravasa após o desfecho... Há sabores que explodem na boca, frustrações que irrompem de súbito. Aqui tentamos entender como os anfitriões da vida boémia que se celebra sem travão da espada de Afonso Henriques ou sem reprimendas clericais, se curvam à excelência de um jogo deste calibre, que molda temperamentos até altas horas da noite.
"É um dérbi especial, há sempre uma ansiedade antes do jogo. Havendo um resultado positivo para o Vitória, já sabemos como vai entusiasmar os nossos adeptos. As pessoas ficam disponíveis para sair e celebrar. Se correr menos bem, já temos de contar com um ambiente mais deprimido", atesta Jorge, proprietário do icónico Oub'Lá na Praça de Santiago, em Guimarães. Filipe Palas, dono do Sé La Vie, dá a voz pelas implicações futebolísticas em Braga, onde cabem por vezes os sobressaltos das 'bocas' de espanhóis, os de Guimarães, e marroquinos, os de Braga.
"Um dérbi é sempre um dérbi, principalmente no nosso Minho. Quando as equipas se defrontam, as cidades ficam ao rubro, não só no dia do jogo, como a semana que antecede e até nos dias posteriores", sustenta.
"Ouvimos histórias dos avós, pais, tios, em que este dia tinha um significado importantíssimo, porque a luta pelo melhor da região está em jogo. É quase tão importante como ganhar um campeonato, é ganhar ao Guimarães. Portanto, se o Braga ganha, é um bom ambiente garantido para a nossa cidade, e de festa também. O que impõe consumo, logo eu, como dono de um estabelecimento, fico contentíssimo", graceja o também músico bracarense, puxando pela memória da noite mais transcendente gerada por um jogo de futebol.
"Lembro-me de uma vitória em Guimarães com um Braga completamente dominador, o que deu num resultado de 0-5. Não foi na minha juventude, foi em 2015, mas foi um Braga, treinado pelo Abel, que não deu qualquer tipo de hipótese de fazer jogar o adversário. O Wilson Eduardo fez um jogo enorme", precisa.
Jorge Lopes também reage com uma memória, apesar de tudo, não tão positiva. "Tenho algumas memórias, até porque também fui ver jogos a Braga. E há um que não sai da cabeça, a última vez que lá fui, em 2009/10. Foi um jogo caótico, o Vitória perde por 3-2, três golos de penálti e acho que quatro expulsões para o nosso lado. Um jogo desastroso para uma estrela em ascensão da nossa arbitragem: Artur Soares Dias. Foi um jogo polémico cheio de situações anómalas. Foi um bom jogo também era o Braga do Domingos, que lutou pelo título até perto do fim", assinala, olhando a protagonistas.
"Estava o Alan de um lado, que tinha acabado de sair do Vitória para o Braga, que fez um grande jogo. Do nosso lado destacou-se o rato atómico Nuno Assis."
"Em vez de uma maçã, um shot ao Moutinho"
Jorge Lopes e Filipe Palas, que cultivam a paixão pelo rock alternativo, também expressam a sua cortesia na hora dos convites a novos visitantes das ilustres instalações noturnas. "Posso dizer que gostava de oferecer um dos gins mais caros ao João Mendes, esperando que o inspirasse para fazer outra bomba igual ao golo que apontou em Braga a época passada. Que nos presenteei com outra obra dessas! Mas também aceitava receber o Moutinho pela trajetória e tipo de personalidade. É alguém que pode acrescentar ainda muito ao futebol português. Gostava de trocar umas ideias com ele e oferecia-lhe também um ótimo gin", brinca Jorge Lopes. Do outro lado...também se reclamam clientes, um cromo repetido e outro em jeito de homenagem. A ideia é atrevida.
"Escolhia o João Moutinho, para em vez de lhe dar uma maçã podre, oferecer um shotzinho da casa. De Guimarães tenho de lembrar o falecido Neno. Pedia-lhe para subir ao palco e cantar uma das suas mornas..."
E, agora, que se aproxima o jogo...também há quem se desdobre das lides do bar, dos afazeres dos cocktails, para as projeções do que vem aí. "Espero um ótimo jogo, duas equipas mais equiparadas que no passado recente. É certo que o Braga tem um potencial maior mas este Vitória apresenta condições de discutir o jogo e estamos muito confiantes", atira. Jorge Lopes, dono do Oub'Lá.
"Rivalidades não podem interferir noutros aspetos da vida"
O bar de Guimarães é, curiosamente, uma homenagem também a uma música emblemática dos grandiosos Mão Morta. Um tributo feito em Guimarães â banda mais icónica de Braga. "Acho que foi de um gosto enorme, não só pela referência de uma das melhores bandas nacionais, como pela coragem em estar situado no coração de Guimarães. Mas referência, referência...é este Sé la Vie", afirma Palas, defendendo, pois claro, a sua dama junto à Sé de Braga.
"Temos a influência da música alternativa e uma certa inspiração nos Mão Morta. Sou assumidamente fã deles. Mas é uma expressão também minhota, que encaixaria muito bem. Há essa ligação, tenho amigos em Braga também. Nunca foi um problema, as rivalidades não devem interferir com outros aspetos da vida. Temos de ter maturidade de aceitar tudo com fair-play", explana Jorge Lopes.
E afinal onde abunda a febre mais exacerbada, que se alimenta de picardias entre marroquinos, os de Braga, e espanhóis, de Guimarães. "Acho que as pessoas de Braga são mais toleráveis a que outro tenha um clube diferente. Gosto muito da cidade de Guimarães, mas vive-se um fanatismo que para um bracarense, torna-se perigoso andar nas ruas", brinca Filipe Palas. "O povo aqui quando ouve um espanhol, diz...'este vem de Guimarães ', ou 'vou passar férias para o estrangeiro, vou para Guimarães'."
Se o dono do Sé La Vie já pensa na invasão de adeptos após o jogo, Jorge Lopes antecipa um cenário de eleição para que o dérbi do Minho preencha emoções no Oub´Lá. "A maior referência em Braga a Guimarães e só mesmo a placa que aponta o caminho para cá. Aqui vamos ter um mini-estádio, em jogos fora vibra-se muito no Oub'Lá, é um ambiente exclusivamente vitorianos. Não vai ser exceção."