VARZIM >> Zé Maria é exemplo do espírito dos que vestiram a camisola poveira. Aos 63 anos, tem a pesca e o mar a correr-lhe nas veias. Herói como jogador, agora como pescador
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Entre lágrimas pelas lembranças da primeira vez que foi convidado para jogar no clube de coração e fazendo questão de tirar a foto com a camisola" mais bonita do mundo" sob chuva torrencial, no cais da Póvoa de Varzim, o seu habitat natural, rodeado de gaivotas e barcos, Zé Maria da "Música", alcunha herdada do pai, que tinha uma paixão por bandas filarmónicas, lembrou um ditado que ainda faz parte do seu quotidiano como pescador, profissão que continua a exercer até se reformar, em breve. "Gaivotas em terra, fome no mar", disse, nostálgico.
"Sinto-me um privilegiado por ter jogado ao lado dele. Mas se ele era o melhor trinco do Mundo, eu era o melhor da Europa"
Ali, todos o conhecem, todas as portas se abrem, não fosse ele uma figura mítica do Varzim e da Póvoa, do seu bairro sul, onde começou a dar os primeiros pontapés na bola , no Leões da Lapa. Chegou a tentar a sorte no Varzim, mas "andava ao mar e não conseguia conciliar". Foi convidado pelos amigos para jogar no Fajozes, começando tarde no futebol, aos 18 anos, mas deu nas vistas e passou a ser conhecido como Yazalde pelos golos que marcava a ponta de lança. Passou pelo Castelo da Maia e, mais a sério, foi contratado pelo Famalicão. "Até que o Varzim se lembrou de mim.
"Comecei como avançado, joguei como lateral, central e médio"
Como poveiro e varzinista, era tudo o que eu queria", recordou com lágrimas no rosto". Foi feliz nos alvi-negros, somou mais de 150 jogos na 1ª. Divisão e foi "obrigado" a sair para o Tirsense, regressando para as duas últimas épocas da carreira no seu clube de sempre, duas divisões abaixo. "Comecei como avançado, joguei como lateral, central e médio. Era o jogador mais polivalente em Portugal e. nesse ano, jogando a defesa ou a trinco, fui o melhor marcador do Varzim com quatro golos, o que diz bem da qualidade dos avançados que tínhamos nessa altura. Mas tive direito a uma caixa de fita azul, oferecida por uma garrafeira", contou a sorrir.
"Até no Pólo Sul pesquei, mas era muito frio"
Decidiu voltar ao mar, em 1994, e foi trabalhar para os Açores, dando ainda "uma perninha" pelos amadores do Angústia do Faial. Rodou o Mundo na faina do bacalhau entre Espanha, Escócia, Inglaterra, Uruguai, Chile, Argentina e Perú. "Até no Pólo Sul pesquei, mas era muito frio", salientou quem, à distância de mais de 30 anos, sabe que jogou com "grandes craques como Rui Barros, Vata, Soares, Lufemba, Adão e o André, que era o melhor trinco do Mundo". "Sinto-me um privilegiado por ter jogado ao lado dele. Mas se ele era o melhor trinco do Mundo, eu era o melhor da Europa", gracejou Zé Maria, que recordou também uma equipa do Varzim que bem poderia ser considerada a mais dura de sempre, ao lado de Washington, Torres, Belmiro e André, entre outros.
"Como poveiro e varzinista, o Varzim era tudo o que eu queria"
"Tínhamos um espírito de grupo fantástico e claro que não éramos simpáticos para os adversários. Os mais velhos incutiam nos mais novos a raça poveira e, quando cheguei, disseram-me logo que o Varzim não era para brincadeiras, e levei isso muito a sério. Tinha fama de caceteiro, mas nunca fui maldoso e a mim partiram-me duas vezes a perna", lembrou, revelando um dos seus segredos: "Bebia sempre dois ou três copos de vinho antes dos jogos e no final um café com chotox. Mas ia para dentro de campo e dava tudo", vincou, pedindo aos atuais jogadores do Varzim para que "tenham noção do emblema que levam ao peito". "Estou disponível para dar umas aulas de raça", concluiu.