Conceição e Jorge Costa feitos de carisma e paixão: "Chateados? Que seja passageiro"
O JOGO escutou quem foi colega, presidente e jogador de Conceição e Jorge Costa. Dois perfis com muito em comum.
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Sérgio Conceição, pelo FC Porto, e Jorge Costa, pelo Ac. Viseu, disputam esta noite um lugar na final da Taça da Liga, num duelo de velhos conhecidos.
Do balneário dos azuis e brancos, nos anos 1990, até aos trilhos que percorreram nos bancos, marcaram colegas com quem partilharam batalhas de 90 minutos, dirigentes dos quais foram apostas para outros voos e jogadores que absorveram ordens e ensinamentos.
O JOGO escutou um testemunho de cada etapa e os três convergiram em várias ideias: Sérgio e Jorge têm carismas fortes, um mais intempestivo, outro mais sereno, mas cada um, à sua maneira, descodifica o enigma da liderança de grupo.
"Quem chegava ao balneário com o rosto mais fechado? O Sérgio [risos]. Todos ficavam zangados [com as derrotas], mas ele um bocadinho mais. O Jorge, como capitão, tinha uma postura mais calma, é normal, mas nenhum gostava de perder", atira Edmilson, extremo brasileiro que foi colega no FC Porto dos agora treinadores. "Já os imaginava como técnicos. Já se via isso em ambos. Sempre tiveram personalidades muito fortes", completa, a torcer para que isto de andarem de candeias às avessas não dure muito mais e que "cheguem em breve a um entendimento".
Isidoro Sousa apostou em ambos para o banco do Olhanense num guião parecido: à sua volta, havia quem desconfiasse... "Sabia do que estava a falar. Reuni as informações que precisava, nomeadamente do presidente do FC Porto. Jorge Costa levou o Olhanense à I Liga, 34 anos volvidos [2008/09], e tem o nome inscrito a letras de ouro na história do clube. Quanto ao Sérgio, na altura [2011/12] estávamos a precisar de um safanão. Muitos diziam que não era a escolha correta, porque nunca tinha treinado, mas aconselhei-me com dois colegas. Ao segundo ou terceiro dia, disse que estávamos perante um grande treinador e que não íamos tê-lo por cá muito tempo", recorda o antigo dirigente, que viu as diferenças na forma de estar. "O Jorge é mais calmo, mas quando lhe pisam os calos... Já o Sérgio diz logo o que tem a dizer, mas cinco minutos depois pedia desculpa, se achasse que errara", descreve. Por outro lado, eram praticamente iguais num aspeto. "Tinham todos os jogadores na mão, titulares, suplentes e não convocados. Como presidente, percebia logo se um plantel estava com o treinador ou não e, com eles, estavam todos unidos. Assim se ganha um balneário", vincou.
Diogo Valente foi treinado por ambos na Académica e destaca essa vertente mais pessoal. "O Jorge foi uma surpresa. Tinha aquela imagem de jogador viril e ameaçador, mas como treinador a liderança era super tranquila. Depois de uma derrota tentava corrigir e trabalhar sobre os erros, mas de uma forma pacífica. Eram constantes as partidas", lembra o agora extremo do Salgueiros. Sérgio era "mais exigente", mas com uma ressalva. "Queria fazer da Académica muito mais do que os objetivos que o clube propunha. Na cabeça dele, era sempre mais e melhor. Também era o primeiro a recompensar os jogadores pelo esforço. Foram muitas as vezes em que parámos na Mealhada e ele nos pagou os jantares. Via-se uma versão diferente daquele Sérgio rígido", recorda.
Testemunhos
Edmilson, ex-colega no FC Porto
"Tinham a mesma personalidade. Chateados? Que seja algo passageiro"
"Foram dois grandes jogadores com quem partilhei o balneário, que tinham a mesma personalidade: nenhum gostava de perder. E assim devem continuar como treinadores. Os dois davam-se muito bem, eram muito amigos. Não sei como estão agora como treinadores... Estão chateados? Acredito que seja algo normal, mas passageiro. Acredito que a relação deles não fique abalada. Mas, dentro de campo, é uma guerra, já se sabe.
Até quando empatávamos era mau, mas o Sérgio ficava um bocadinho mais zangado. Sente mais os resultados menos positivos. Daquele tempo, há muitos que deram treinador. Eram grandes jogadores, que se prepararam para seguir uma nova carreira. Muitos jogos importantes ficaram na memória. O 5-0 na Luz, para a Supertaça, o 3-2 em San Siro... Grandes jogos em que os dois estiveram muito bem".
Isidoro Sousa, ex-presidente no Olhanense
"Tanto um como outro destacavam-se pelo cuidado enorme com os jogadores"
"O Jorge, além de um treinador especial, é uma pessoa fantástica, muito humilde. Falamos regularmente e tem feito um trabalho excelente no Ac. Viseu. Merece, porque tem trabalhado bastante e, no Olhanense, a gratidão é para a toda a vida. Quando o Sérgio tem resultados menos bons, faço questão de lhe enviar uma mensagem. Quando corre bem, ele não precisa. Era muito exigente com ele próprio e com a estrutura, mas dá os seus frutos. Ainda é novo e vai alcançar patamares ainda mais elevados. Tanto um como outro tinham um cuidado enorme com os jogadores, havia sempre uma palavra para os que eram menos utilizados, porque, para eles, todos fazem parte das vitórias, enquanto outros treinadores põem mesmo de parte. Nunca tive um único jogador que se queixasse e a essência do futebol é um balneário unido".
Diogo Valente, ex-jogador na Académica
"Jorge voltou a mostrar todo o valor. Eu já sabia que o Sérgio ia ser um dos melhores"
"Na pré-época, o Jorge Costa criou uma espécie de Casa dos Segredos da Académica, em que cada elemento da equipa técnica e um diretor tinha um segredo. Alguns causaram surpresa quando foram revelados, coisa que acontecia na palestra do jogo. Quando fomos jogar à Luz, revelaram um segredo da equipa técnica e foi uma palhaçada. Em vez de passar responsabilidade, tentou libertar-nos. Estou felicíssimo, porque o Jorge andou um bocado desaparecido e voltou a mostrar todo o valor e potencial que tem. O Sérgio, além de ter sido o treinador com quem mais evoluí, não só a nível tático, mas também em relação à exigência que um jogador tem de ter com ele próprio, é bastante rigoroso. Fiquei sem dúvidas de que ia ser dos melhores. Que seja um bom jogo e que façam as pazes, porque são duas grandes pessoas".