Clayton recorda o FC Porto: "Disse que não e assinei logo antes que se arrependessem"
REPORTAGEM - O pai Clayton já não queria saber da bola, a não ser vibrar, como adepto, com os jogos do FC Porto, mas não resistiu ao apelo do filho.
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Clayton Ferreira Cruz fez uma carreira de oito anos em Portugal à boleia de um pé esquerdo que o trouxe em 1999/2000 para o Santa Clara e o catapultou para o FC Porto, ao cabo de 13 jogos e nove golos nos açorianos. Apesar de ter jogado noutros emblemas, como o Sporting, Penafiel ou V. Guimarães, foi nos dragões que Clayton ganhou todos os títulos internos e ainda uma Taça UEFA sob a égide de José Mourinho. Mas isso são tudo recordações da década passada, pois os olhos do brasileiro estão agora virados para Clayton Júnior, o filho que está a dar os primeiros passos por cá à boleia do Amarante. Júnior entrou no futebol luso pela porta do Lousada, em outubro do ano passado, e saltou da Elite da AF Porto para o Campeonato de Portugal no espaço de três meses. Ao fim de sete jogos, estreou-se a marcar, bisou no empate (2-2) com o Ginásio Figueirense e mostrou o que o pai apregoa: há qualidade para além do apelido. "Só comecei a levar o futebol a sério a partir dos 18 anos. Tenho características parecidas com o meu pai e sempre lhe pedi para vir para Portugal, pois a Europa é uma porta que me pode levar para qualquer patamar", conta Júnior.
O pai já não queria saber da bola, a não ser vibrar, como adepto, com os jogos do FC Porto, mas não resistiu ao apelo do filho. "Até aos 18 anos ele levou uma vida boa e quando me disse que queria ser profissional, eu respondi que não ia ser fácil porque é preciso trabalhar muito. Mas eu vejo qualidades nele e tive de abraçar a causa, senão ficava em casa", avalia Clayton. E o que se pode esperar do mais novo da família? "Ele quis ser extremo-esquerdo. Embora seja destro, também joga muito bem com o pé esquerdo, coisa que eu não fazia pois era péssimo com o direito. É muito rápido, tem poder de explosão, mas é um menino de 20 anos que precisa de paciência."
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A estreia aconteceu a 19 de janeiro e na bancada estava um pai bem mais nervoso do que qualquer outro jogo que tenha disputado durante a carreira. "Foi o dia em que fiquei mais nervoso na minha vida desportiva. Sofri muito nessa partida", conta. A vida de Clayton depois do desporto-rei faz-se no Brasil, o que obriga o antigo jogador a estar longe do filho. "Viver longe dele é muito difícil. Queria estar sempre a dizer-lhe tudo o que sei sobre futebol", relata.
Todavia, a relação de pai e filho fica em parte de fora quando se trata de futebol. "O meu pai é o meu empresário. Isto não é uma brincadeira. Moro sozinho há mais de meio ano e o futebol envolve muitos sacrifícios. Não é fácil chegar ao topo", observa Júnior. O palmarés que Clayton deu-lhe ferramentas para hoje tentar "encurtar" os caminhos do rebento. "Tento passar-lhe coisas que só aprendi com 25 ou 26 anos. Se eu sei isso, ele não precisa de esperar tanto tempo." Embora seja o fã número um do filho, Clayton não quer favorecimentos à custa do apelido. "Não quero que as pessoas vinculem a imagem dele à minha", pede. Por agora, Júnior quer viver o futebol à sua maneira. "Sonhos? O primeiro é chegar à II Liga, que é o campeonato mais próximo do CdP", responde.
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O n.º 28 graças a Pinto da Costa
Clayton usou o número 28 nos tempos do FC Porto e foi Pinto da Costa quem lhe "ofereceu" o dorsal por ser a data de aniversário do presidente [28 de dezembro]. "É uma honra que carrego para a vida. Pinto da Costa é a figura mais importante da história do futebol português", afirma Clayton. O legado iniciado pelo líder portista tem agora continuidade em Clayton Júnior.
Vende madeira e diz que jogou com CR7
Clayton investiu no negócio da madeira de eucalipto, ainda como jogador. Hoje tem várias fazendas, mais de 120 funcionários e vende para todo o Brasil. "Ganho mais dinheiro agora", ri. Os negócios até se tornam mais fáceis quanto descobrem quem é: "Fui treinado por Mourinho, Fernando Santos e joguei com o Cristiano Ronaldo. São bons cartões de visita não são?"
Os amigos que não se contam com as mãos
Clayton foi treinado por Santos ou Mourinho nas três épocas e meia de FC Porto. Estes foram os técnicos que mais marcaram, mas os dedos das mãos não chegam para enumerar os jogadores com quem fez amizade. "Jardel, Deco, Jorge Costa, Capucho, Paulinho Santos, Costinha, Domingo, Folha, Jorge Andrade, o ministro Costinha... ia ficar a noite toda a falar de pessoas que fazem parte da minha vida".
"Assino já antes que se arrependam"
O salário oferecido pelo Santa Clara já foi bem melhor do que Clayton auferia no Brasil, mas a proposta de ir para o FC Porto deixou o brasileiro louco: "Estava numa mesa com Pinto da Costa, Adelino Caldeira e Reinaldo Teles. Pediram-me para ler e ver se queria mudar algo no contrato. Disse que não e assinei logo antes que se arrependessem. Se colocassem lá dez anos eu assinava por dez anos."
Júnior ficou fã do Levezinho
Clayton Júnior não se lembra bem dos amigos com quem o pai jogava é de um em especial, do ano no Sporting, que o caçula se recorda. "O Liedson passava a vida lá em casa. Era uma pessoa espetacular e marcava muitos golos. Um dia gostava de ser assim", refere.
As finais das Taças e o calor de Sevilha
Apesar de ser ainda um bebé nos primeiros anos do pai em Portugal, Júnior esteve nas três finais de Taças de Portugal que Clayton disputou e na final da Taça UEFA em Sevilha. "Estavam 40 graus", lembra.