Brás da Cunha: "O FC Porto precisa de gente com paixão, qualidade técnica e, sobretudo, independência"
ENTREVISTA, PARTE I - Rosto principal dos “Insubmissos”, candidatos ao Conselho Superior pela Lista D, Miguel Brás da Cunha considera que os programas divulgados “denotam desconhecimento das competências” do órgão consultivo
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A expectativa do movimento “Por um FC Porto maior, unido, insubmisso e eclético” é clara: superar os três eleitos de há quatro anos para o Conselho Superior. A O JOGO, Brás da Cunha garante que a Lista D quer ser “fator de união”.
Em 2020, os “Insubmissos” elegeram três elementos para o Conselho Superior. Qual a fasquia para as eleições de 27 de abril?
-Em 2020 foi um excelente resultado. Quatro anos depois, com um lastro de trabalho que nos parece relevante e a reafirmação de ideias fundamentais - mais ainda no contexto atual -, a expectativa é, claramente, de reforço do resultado anterior. O clube precisa, no seio do Conselho Superior [CS], de gente com paixão, qualidade técnica e, sobretudo, independência relativamente a qualquer uma das candidaturas que venha a vencer. Permitirá que elementos essenciais do nosso manifesto possam ser colocados na agenda do CS sem constrangimentos.
Qual a importância de contar com elementos independentes no CS?
-Há um conjunto de matérias nas quais o parecer do CS é necessário. As contas, os estatutos, uma série de aspetos estruturais. Os estatutos dizem que o CS deve ser chamado a pronunciar-se sempre que estejam em causa matérias de grande relevo para a vida do clube. E é precisamente nesse aspeto que me parece que o CS tem muito caminho a percorrer. Os programas eleitorais divulgados denotam desconhecimento das competências estatutariamente consagradas e até do modo de convocação e funcionamento do CS. Denotam desconhecimento do papel que o CS teve no último mandato, muito por força do impulso que os eleitos da Lista D deram. A presença de elementos independentes será relevante em temas estruturais. O controlo da SAD, o relevo social, do qual falamos há muito tempo... O ecletismo também. Discutir temas como estes e outros, com a independência de quem está necessariamente longe das questões mais relacionadas com o dia a dia, dará ao CS força para pôr na agenda elementos definidores da alma do clube.
“Não devia ser necessário fazer 300 quilómetros para se poder votar”
O CS cessante fica muito marcado pela proposta de estatutos apresentada?
-A história da alteração estatutária teve aspetos positivos e negativos. A ideia de uma necessidade de alteração foi reconhecida pelo anterior presidente da MAG, o doutor Matos Fernandes. Mais tarde, os estatutos foram fruto de unanimidade de posições. Primeiro, a consagração estatutária inultrapassável de que o clube terá sempre maioria e controlo da SAD. É um aspeto que continua a estar no nosso manifesto e, se os estatutos só tivessem alterado essa norma, já seria uma grande vitória. O segundo aspeto, que levantou polémica, foi a questão das votações. A proposta dizia que, para lá da votação no Dragão, como vai acontecer dia 27, passava a ser equacionável que houvesse voto por correspondência, fora do Dragão e, eventualmente, eletrónico, desde que garantida a fiabilidade e segurança das eleições. Assistimos hoje a lamentos de pessoas que têm de fazer 300 quilómetros para votar. Não deveria ser necessário. Outro exemplo: os vice-presidentes não têm de ter o mesmo número de anos de sócio do presidente. Mas os estatutos dizem que, se o presidente não conseguir terminar o mandato, é substituído por um “vice”. Coisa que a proposta também ia resolver. Quando foi levada a votação geral no CS, houve unanimidade dos conselheiros de todas as listas, exceção feita ao presidente da Direção, entendendo que não devia pronunciar-se. Agora a parte negativa: teria sido preferível que esta discussão tivesse tido lugar um ano antes, ou pelo menos antes do verão. A proximidade significativa do ato eleitoral não permitiu que os sócios apreciassem os estatutos como tal. Aquela AG de 13 de novembro foi tudo menos isso. Decorreu de modo inaceitável, com a presença de elementos que não deviam estar presentes, comportamentos inaceitáveis por parte de pessoas que estavam dentro do recinto e que fizeram daquela noite uma noite tristíssima para a história do FC Porto. Transformaram um bom trabalho num resultado negativo, que foi o modo como a AG decorreu, desde a preparação ao ambiente que foi criado nas semanas que a antecederam. É lamentável, porque, uma semana depois, o clube demonstrou que tinha capacidade para organizar uma AG serena e democrática. No final, ganha quem tiver que ganhar. É isto que as AG devem ser.
Na altura, Pinto da Costa sugeriu que a proposta de alteração dos estatutos fosse retirada...
-Na primeira intervenção da AG de dia 13, o presidente referiu que, pessoalmente, não acompanharia alterações que tinham a ver com o artigo 35, com a questão do número mínimo de anos para votar e com a alteração da data das eleições. Não foi uma retirada total da proposta. O que me surpreende é que, agora, haja tal unanimidade em torno da votação fora do Dragão, quando antes da AG se lançava uma neblina sobre essa possibilidade. O que queremos é mais associados a votar. Se temos 80 mil votantes, devemos criar condições para que os 80 mil votem sem constrangimentos. Temos de ter alternativas, como há, por exemplo, nas Legislativas. São criados polos de votação com garantia de segurança e fiabilidade. O que também nos surpreende um pouco é o “umbiguismo” dos portuenses. É muito fácil ser portista e votar para quem mora no Porto ou em Gaia, mas o FC Porto não se limita a esta área. Está por todo o país e mundo. Esse é um dos pontos que gostávamos que já estivesse resolvido e vamos bater-nos para que assim seja.
“Todos os eleitos para os órgãos sociais têm a obrigação de agregar”
A divisão atual entre duas das listas poderá refletir-se no próximo CS e dificultar as reuniões, por exemplo?
-Pela primeira vez, no mandato 2020-2024, o CS teve uma representação que foi além da lista única. Pela primeira vez houve pluralidade e isso não impediu que grande parte das pessoas funcionasse de forma notável e entrosada na defesa do clube. Um exemplo claro é o da Comissão de Estatutos, em que estavam presentes todas as “tendências” e funcionámos perfeitamente. A partir de dia 27, esperamos que essa capacidade esteja novamente presente. Há separação no nosso clube, não vale a pena esconder. Mas temos acentuado que unidos venceremos e separados desapareceremos, pelo menos na relevância. Todos os que sejam eleitos para os órgãos sociais têm a obrigação de ser um fator de agregação. O CS em especial, por ser um órgão em que as várias tendências vão estar presentes. Achamos que, pelo perfil e qualidade dos nossos candidatos, pelas ideias que defendemos, temos papel muito importante a desempenhar nessa união.