"Alegada corrupção desportiva no Benfica? A consequência no limite é a descida de divisão"
Três questões a Lúcio Correia, Professor de Direito do Desporto da Universidade Lusíada de Lisboa.
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1 - Como avalia esta decisão do Conselho de Disciplina (CD) de instaurar um processo disciplinar à SAD do Benfica, alegadamente na sequência do megaprocesso de corrupção desportiva de que é arguida?
-Primeiro, temos de ter a certeza dos factos que motivam a abertura do procedimento disciplinar, se são aqueles que dizem respeito à questão de corrupção ou não. Segundo, a constituição de arguido da SAD do Benfica teve a ver com a suspensão dos prazos de prescrição do inquérito e não com o apuramento de todos os factos ou com o fim da investigação. Isto é normal, não há aqui nada de novo. A constituição de arguido, em qualquer processo-crime, não constitui motivo bastante para a abertura de um processo disciplinar desportivo, pelo que só o Conselho de Disciplina saberá quais os factos que motivam o processo.
2 - Justificava-se mais a abertura de um processo de inquérito e não de um disciplinar?
-Para haver um processo disciplinar têm de existir factos e aqui quais são os factos? No processo-crime não sabemos, porque estão em segredo de justiça. O normal é a abertura de processo de inquérito e ficar a aguardar uma posição do Ministério Público, o CD pedir-lhe informações ou uma certidão para avaliar se tem capacidade para abrir um processo disciplinar. Ou o Conselho de Disciplina foi precipitado ou tem conhecimento de factos que lhe permite abrir o processo disciplinar e sustentar uma acusação. Uma pessoa ou entidade serem arguidas não quer dizer que serão condenadas. Normalmente, o Ministério Público só solta as informações e os factos depois dele próprio concluir a acusação, após a conclusão da investigação.
3 - No caso de condenação por corrupção desportiva, quais são as consequências previstas nos regulamentos?
-A justiça desportiva é independente da criminal, podendo originar decisões completamente distintas. Agora, o processo vai para a Comissão de Instrutores, sim, mas o que é que vai para lá? Quais são os factos? Vai investigar o quê? De qualquer forma, a consequência no limite é a descida de divisão, uma multa e a impossibilidade temporária de participação nos campeonatos profissionais, como está definido no Regulamento Disciplinar da Liga.
O QUE ESTÁ EM CAUSA:
O Conselho de Disciplina (CD) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) instaurou um processo disciplinar à SAD dos encarnados. Segundo o comunicado do CD divulgado ontem, esta decisão surge "na sequência de notícias divulgadas na Comunicação Social".
Na mesma nota, é referido que a instauração do processo acontece "na medida em que a factualidade agora conhecida possa ser diversa daquela apreciada em outros procedimentos disciplinares".
Em causa está o megaprocesso que investiga factos que possam incorrer no crime de corrupção desportiva, emergentes dos emails pirateados ao Benfica.
Como consequência imediata, foram constituídos arguidos a própria SAD, o presidente Rui Costa, o administrador Soares de Oliveira e os ex-dirigentes Nuno Gaioso e José Eduardo Moniz, aos quais se juntará Luís Filipe Vieira que, à data, não estava em Portugal.
Os elementos do CD admitem que poderão surgir novas informações que, sendo eventualmente relevantes, possam levar o órgão a avaliar novamente a atuação da SAD benfiquista à luz dos regulamentos desportivos.
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De referir que é habitual a justiça desportiva instaurar estes processos, de inquérito ou disciplinares, enquanto a justiça civil procede à investigação. Recorde-se que os regulamentos da Liga, como determina o 65.º do Regulamento Disciplinar, prevêem nos casos de corrupção a pena de descida de divisão, que pode ser aplicada até um máximo de dez temporadas desportivas.
Em resposta, a SAD benfiquista "repudia a decisão" do CD "face à inexistência de novos factos a uma matéria já de si objeto de acompanhamento passado".
"Uma manifesta má-fé do Conselho de Disciplina que só pode ser justificada à luz do recorrente desrespeito e comportamento persecutório ao Sport Lisboa e Benfica. Uma decisão ainda mais inaceitável tendo em conta que a Comissão de Instrutores da Liga, órgão que deveria ter notificado o Sport Lisboa e Benfica em tempo útil, também não o fez, tendo o clube tomado conhecimento deste processo disciplinar através da Comunicação Social", pode ler-se em comunicado.
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A finalizar a reação, os encarnados apontam "coincidências e erros a mais para quem, tendo o estatuto de utilidade pública desportiva, lhe cabe a responsabilidade de defender o futebol português, mas que, sucessivamente, cai na subserviência de interesses específicos rivais do Sport Lisboa e Benfica", o que vem potenciar o clima de guerra aberta do Benfica ao referido órgão federativo.
A título de exemplo, os responsáveis da Luz exigiram publicamente a "dissolução" do órgão presidido por Cláudia Santos, em fevereiro do ano passado.