O terceiro elemento da geração dos Sousa coloca os indicadores nos ouvidos sempre que marca. A teimosia de Afonso em seguir no FC Porto está a ser premiada e um novo contrato é tema para breve
Corpo do artigo
Três golos nos últimos três jogos e um total de dez nesta temporada fazem de 2019/20 a melhor época da (ainda) curta carreira de Afonso Sousa. O extremo do FC Porto B, de 19 anos, é a principal figura da retoma dos dragões na II Liga, que passaram a respirar melhor na classificação, fruto de três vitórias consecutivas.
Sempre que Afonso marca, há espaço para um festejo peculiar e que é, no fundo, um grito de revolta em surdina do internacional jovem português. Foi em abril de 2019 que Afonso Sousa renovou até 2021, mas o processo esteve envolto num certo impasse. Na altura, o Sporting seguiu com atenção os passos do jogador e algumas pessoas aconselharam Afonso Sousa a seguir a carreira nos leões, pois achavam que o atleta ia ter mais oportunidades em Alvalade. Descendente de uma linha de portistas, encabeçada pelo avô, António Sousa, a quem se seguiu Ricardo Sousa, Afonso pensou com o coração e optou por continuar a formação no Olival.
E foi tapando os ouvidos e os olhos a todos os que lhe disseram que a afirmação na equipa B seria tardia. Uma espécie de história ao jeito da conhecida parábola do "Sapo Surdo", em que um sapinho vai subindo uma parede ao mesmo ritmo que lhe dizem que vai cair. Como o sapo era surdo, insistiu e chegou ao topo. No festejo, Afonso fecha os olhos e a boca e tapa os ouvidos como que a dizer que não fala, não ouve e não vê, apenas trabalha para chegar ao topo.
"Nunca foi de fazer tantos golos, sempre foi mais de construir e assistir. Ele é um 10 à antiga"
A etapa nas camadas jovens culminou com um título europeu - a Youth League - e o nacional de juniores, e Afonso Sousa passou a sénior à boleia da equipa B. Apesar de ser médio-ofensivo, o jogador foi desviado para extremo na época passada e é na ala que tem marcado como nunca. Os dez remates certeiros que leva dividem-se entre cinco na II Liga, quatro na Youth League e um na Premier League Internacional Cup, números que suplantaram a anterior melhor marca (oito) nos sub-17 dos dragões, de 2016/17.
A veia inesperada até surpreende a família e a recente forma é motivo de conversa na Tabacaria Glória, um dos quiosques mais emblemáticos de São João da Madeira, que é propriedade dos Sousa. "O Afonso nunca foi jogador de fazer tantos golos, sempre foi mais de construir e assistir", reconhece o pai, Ricardo. A avó, Isaura, tem de aguentar as brincadeiras da freguesia, que aponta defeitos aos remates certeiros do neto. "Dizem que foi frango, ou que o guarda-redes não estava a olhar, mas eu ralho com os clientes e levamos na brincadeira", revela.
O extremo fartou-se de ouvir que iria demorar a afirmar-se na equipa B e decidiu tapar os ouvidos, não falar e apenas trabalhar. Agora, responde com golos e um festejo à medida
Todos os dias, Isaura e António vendem e registam jogos da sorte, mas António não perde pitada da ascensão de Afonso e encontra semelhanças entre ambos. "Tem muita qualidade no passe curto e longo, lê bem o momento certo para o fazer e ainda pode evoluir no remate. No meu caso aconteceu o mesmo e noto que ele se parece ao avô", comenta. António e Ricardo dizem que Afonso Sousa é um criativo puro, apesar de estar a jogar a extremo. "Ele é um 10 à antiga", afirma o pai. O avô até dá um exemplo de carreira. "Na minha formação era ponta de lança e um dia o Fernando Cabrita, no Beira-Mar, colocou-me a 10. Provavelmente é o que vai acontecer ao Afonso", refere António, que reconhece que ao neto falta velocidade para ala e pede mais capacidade para "arriscar e rematar à baliza".