Bruno de Carvalho e a exigência que quase fulminou a reestruturação financeira
"Observador" publicou esta terça-feira o capítulo VI do livro do ex-presidente do Sporting, onde este recorda um episódio com o representante do Millennium BCP, Miguel Maia
Bruno de Carvalho revela no capítulo VI do livro "Sem Filtro", publicação que vai apresentar na próxima sexta-feira, um episódio, vinca, caricato no processo de reestruturação financeira executado no início do seu primeiro mandato. Num excerto publicado em exclusivo pelo "Observador", o agora ex-presidente do Sporting revela uma exigência de última hora do representante do Millennium BCP, Miguel Maia, que quase fulminou as negociações.
"Depois de muitos avanços e recuos, fui às instalações do BES para ter uma reunião com Joaquim Góis, representante deste banco, e Miguel Maia, pela parte do Millennium BCP. Naquele dia, tínhamos conseguido ultrapassar todos os assuntos mais delicados e preparávamo-nos para assinar um pré-acordo, de modo a que este fosse depois visto pelos advogados das várias partes, para então celebrarmos, em definitivo, o memorando da restruturação financeira. Tudo parecia acordado depois de mais uma reunião que demorou muitas horas. Já só faltava mesmo cumprimentarmo-nos e passarmos à próxima fase. Existia um espírito de satisfação e alívio por, finalmente, termos chegado a um patamar de entendimento que em muitos momentos parecera impossível de alcançar. É então que Joaquim Góis se levanta e diz que tem de ir à casa de banho. Fiquei sozinho com Miguel Maia e o ambiente parecia tranquilo. Mas não por muito tempo".
E prossegue: "Miguel Maia resolveu criar uma dificuldade inesperada e totalmente desnecessária naquela altura. Disse-me que o Millennium só assinava a restruturação caso eu me comprometesse a fazer um pedido de desculpas público. Segundo ele, em algumas conferências de imprensa que realizei sobre este tema, tinha dado a entender que a banca estava a ser um empecilho e a pôr em causa, propositadamente, o futuro do Sporting. Revelou também que ele e as pessoas do seu banco não tinham gostado dessas minhas declarações e que, por isso, não havia outra solução a não ser eu retratar-me e mostrar o meu arrependimento diante dos órgãos de comunicação social. Aquilo era um braço de ferro totalmente inusitado. Depois de horas e horas de reunião, de conversa construtiva, de diálogo com vista a um entendimento benéfico para todas as partes, e aproveitando a ida do colega do BES à casa de banho, o representante do Millennium BCP faz uma inesperada exigência de última hora e completamente descontextualizada de tudo o que havíamos discutido até essa altura", atirou, rematando: "Não aguentei aquela conversa. Agarrei nas folhas do pré-acordo que estavam em cima da mesa e atirei-as para o ar. De seguida, levantei-me e disse-lhe que não tolerava semelhante atitude e desfaçatez contra o Sporting Clube de Portugal: 'A restruturação acaba aqui'".
O antigo dirigente explica, contudo, que após fumar um cigarro nas instalações do BES, que lhe foi dado numa sala onde estava Ricardo Salgado, ex-presidente do grupo, lá voltou para a reunião com os representantes dos bancos onde tudo se resolveu. Miguel Maia, escreve, voltou com a exigência atrás e a reestruturação financeira avançou.