O primeiro-ministro António Costa e oito outros líderes europeus subscrevem uma carta hoje dirigida ao presidente do Conselho Europeu a reclamar a implementação de um instrumento europeu comum de emissão de dívida para enfrentar a crise provocada pela covid-19
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Na carta enviada a Charles Michel na véspera de um Conselho Europeu consagrado à resposta europeia à pandemia do novo coronavírus -- que se realizará por videoconferência na quinta-feira -, os chefes de Estado e de Governo de Portugal, França, Itália, Espanha, Bélgica, Luxemburgo, Irlanda, Grécia e Eslovénia defendem que, face à gravidade da situação, além das medidas já tomadas, é necessário avançar para "um instrumento comum de dívida, emitida por uma instituição europeia, para angariar fundos no mercado na mesma base e em benefício de todos os Estados-membros".
De acordo com os oito líderes europeus, tal instrumento asseguraria "um financiamento a longo prazo estável para as políticas necessárias para fazer face aos danos causados por esta pandemia", nas mesmas condições para todos os Estados-membros.
Na sua opinião, os argumentos em favor de um instrumento comum de emissão de dívida são "fortes", já que todos os países estão a enfrentar "um choque externo simétrico, pelo qual nenhum país é responsável, mas cujas consequências negativas são sofridas por todos".
Medida asseguraria "um financiamento a longo prazo estável para as políticas necessárias para fazer face aos danos causados pela pandemia"
"Este instrumento de dívida comum deveria ter o tamanho suficiente e uma maturidade longa, de modo a ser totalmente eficiente", defendem, acrescentando que os fundos recolhidos através dessa emissão de obrigações europeias seriam aplicados exclusivamente no financiamento, em todos os Estados-membros, "dos investimentos necessários nos sistemas de saúde e nas políticas temporárias para proteger as economias e modelos sociais" europeus.
"Dando uma mensagem clara de que estamos a enfrentar em conjunto este choque único, reforçaríamos a União Europeia e a União Económica e Monetária e, ainda mais importante, transmitiríamos uma mensagem forte aos nossos cidadãos", escrevem António Costa, o Presidente francês Emmanuel Macron, e os chefes de Governo Giuseppe Conte (Itália), Pedro Sánchez (Espanha), Sophie Wilmès (Bélgica), Xavier Bettel (Luxemburgo), Leo Varadkar (Irlanda), Kyriakos Mitsotakis (Grécia) e Janez Jansa (Eslovénia).
Os nove líderes sugerem também que, "no mesmo espírito de eficiência e solidariedade", poder-se-ia igualmente explorar "outros instrumentos, tais como um financiamento específico para despesas relacionadas com o coronavírus no orçamento da UE, pelo menos para os anos de 2020 e 2021, além dos anúncios já feitos pela Comissão Europeia".
Numa carta de quatro páginas, os chefes de Estado e de Governo dos nove Estados-membros signatários sublinham também a necessidade de, num contexto de implementação de medidas socioeconómicas sem precedentes, com reflexos sem paralelo na atividade económica, "preservar o funcionamento do mercado único", até para assegurar que os cidadãos europeus não se debaterão com quaisquer carências.
Nesse contexto, comprometem-se a manter as fronteiras internas abertas ao comércio necessário e em colocar "todos os esforços para assegurar a produção e distribuição de equipamento médico e de proteção essencial", fazendo-o chegar o mais rapidamente possível aos locais onde são mais necessários.
A terminar, os líderes defendem que também é necessário começar a trabalhar no "day after" (o dia seguinte) e refletir sobre como melhor organizar as economias transfronteiriças, as cadeias de valor globais, setores estratégicos, sistemas de saúde e projetos e investimentos comuns europeus".
"Se queremos que a Europa amanhã viva à altura das aspirações do seu passado, precisamos de atuar hoje e preparar o nosso futuro comum. Abramos este debate agora e sigamos em frente, sem hesitação", concluem os chefes de Estado e de Governo.
A pandemia de covid-19 colocou inesperadamente na agenda europeia a questão da mutualização da dívida, sendo cada vez mais as vozes a defender a emissão de obrigações pan-europeias, ou 'coronabonds', para amortecer o brutal impacto socioeconómico do novo coronavírus.
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Atualmente, cada país da zona euro emite títulos de dívida nos mercados de obrigações, com garantias nacionais. Os 'coronabonds' seriam emitidos em nome da União Europeia, o que significa que seriam emissões de dívida partilhadas pelo conjunto dos Estados-membros, protegendo assim os mais frágeis de especulações de mercado e taxas de juro altíssimas.
No entanto, na reunião do Eurogrupo celebrada na terça-feira à noite, por videoconferência, os ministros das Finanças europeus, sem excluírem a eventual mutualização da dívida, privilegiaram a possibilidade de ativar uma linha de crédito do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE).
No final do encontro, o presidente do Eurogrupo, e ministro das Finanças português, Mário Centeno, questionado sobre a possibilidade de emissão comum de dívida, ou os chamados 'coronabonds', apontou que "nenhuma solução foi hoje afastada" e garantiu que serão "exploradas todas as possibilidades".
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Todavia, quer o presidente do Eurogrupo, quer o comissário europeu da Economia, Paolo Gentiloni, quer o diretor do MEE, Klaus Regling, centraram-se na possibilidade de recurso a um instrumento de precaução já existente, uma linha de crédito condicional, que, apontaram, teve bom acolhimento entre a generalidade dos ministros das Finanças, um fator que apontaram ser importante, dado esta questão exigir consensos.
A ideia, entretanto também transmitida hoje por carta a Charles Michel, passaria por o MEE, o fundo de resgate permanente da zona euro, disponibilizar uma linha de crédito específica para todos os Estados-membros, que poderiam receber imediatamente fundos num montante equivalente a 2% do seu Produto Interno Bruto (PIB) para medidas de combate ao novo coronavírus.
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou perto de 428 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 19.000.
Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia, cujo epicentro é atualmente a Europa, com mais de 226.000 casos, sendo Itália e Espanha os dois países do mundo com mais vítimas mortais (6.820 e 3.434 óbitos, respetivamente).
Em Portugal, o número de mortes por covid-19 subiu hoje para 43, revelou hoje a Direção-Geral da Saúde (DGS), num boletim que regista 2.995 casos de infeção.