Nega à Superliga europeia, denunciantes e outras propostas desportivas dos candidatos à Europa
ELEIÇÕES EUROPEIAS - Candidatos dizem de sua justiça sobre questões estruturais, como a Superliga, o estatuto de denunciante e a distinção entre atividade física e desporto profissional.
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Sábado é dia de Taça, domingo é dia de eleições na Europa. Portugal vai escolher os seus 21 deputados. São poucos, mas espera-se que sejam bons e que os eleitores sejam muitos.
São 427 milhões os eleitores na União Europeia. É o segundo maior escrutínio do mundo, a seguir à Índia, com uns imbatíveis 900 milhões.
As eleições europeias, como são conhecidas as mais mal-amadas das eleições, pelo menos em Portugal, vão encher o nosso dia de domingo. Os portugueses elegem 21 deputados para um parlamento que tem 751 lugares (estima-se que o número baixe para os 701 quando os ingleses abandonarem mesmo a União Europeia).
São apenas 21 os deputados portugueses num universo de 28 países. É pouco? É, mas tem tudo a ver com o peso demográfico (e, nesse aspeto, somos levezinhos). Uma das grandes preocupações dos candidatos é a abstenção. Os portugueses, e a comunidade europeia em geral, não passam grande cartão a estas eleições.
"Discordamos em absoluto de uma Liga dos Campeões fechada" - Francisco Guerreiro (PAN)
Por exemplo, nas últimas europeias em Portugal (2014) a abstenção foi de 66,2%. No primeiro ato eleitoral para o Parlamento Europeu, em 1987, apenas 27,65% dos eleitores portugueses ficaram em casa. Curiosamente, nesta campanha que hoje termina os partidos viram-se obrigados, por questões estratégicas, a entrar em ataques e contra-ataques constantes e poucas vezes revelaram grandes preocupações com a abstenção.
Mas deviam - até porque já se sabe que vai estar um calor a convidar mais para a praia do que para exercer um direito cívico que custou muitos cravos a ganhar, o direito de votar. Também é verdade que fizeram desta campanha um treino aplicado para as eleições legislativas de outubro, deixando por discutir e esclarecer as grandes questões europeias. Houve exceções e cabe ao povo descobri-las.
O JOGO quis estar por dentro destas eleições, até porque se joga também muito o futuro da União Europeia em termos de correlação de forças e do perigo de os nacionalistas serem cada vez mais no Parlamento da União. E por isso lançámos o desafio aos seis candidatos dos partidos com assento parlamentar, colocando-lhes três questões (abaixo), uma delas relacionada concretamente com algo que incomoda muito os clubes que não são tubarões no futebol europeu.
"A diretiva foi por mim subscrita [proteção dos denunciantes]" - Pedro Marques (PS)
A UEFA tem ameaçado com a criação de uma liga para os mais fortes, sem olhar ao que cada clube faz no seu país (nem que seja campeão). No mundo do futebol é praticamente unânime, pelo menos a avaliar por declarações públicas, a recusa de uma liga com essas fronteiras limitadas aos colossos e aos mais ricos europeus.
Pois também os nossos candidatos, e nisso estão todos de acordo - os que responderam à questão - recusam de todo a ideia. "O que é adequado e correto é a manutenção da relação das competições nacionais com as competições internacionais", diz João Ferreira, candidato da CDU, que revela uma grande sensibilidade com a questão.
"Somos contra a exclusão de países das grandes competições" - Marisa Matias (BE)
"Somos contra qualquer modelo que promova a exclusão à partida de países das competições ao mais alto nível", afirma Marisa Matias, cabeça de lista do Bloco de Esquerda, com a reeleição já garantida, a avaliar pelas últimas sondagens (e não vai sozinha). Francisco Guerreiro, do PAN, que também anda sorridente com as sondagens, não tem dúvidas sobre esta questão: "Vedar o acesso a competições internacionais alcançadas com bastante mérito e esforço seria uma injustiça incompreensível."
O JOGO gostava muito de ter também a opinião de Paulo Rangel (PSD), mas o candidato laranja não se mostrou disponível, ao contrário dos seus concorrentes.
"O desporto organizado merece maior atenção por parte do direito europeu" - Nuno Melo (CDS)
Alargar o estatuto do denunciante
A proteção dos denunciantes e o alargamento do seu estatuto foi outra das questões que colocámos aos candidatos. E, com uma ou outra variante, todos estão de acordo em alargar o estatuto do denunciante, mas com cautela, para não se tornar num paraíso da delação. Todos concordam com a diretiva recentemente aprovada pelo Parlamento Europeu, mas cada um dos candidatos junta outros contributos para aperfeiçoar e adequar o estatuto. Há uma certeza: os candidatos parecem muito atentos à questão dos denunciantes.
"A CDU defende o combate eficaz à corrupção" - João Ferreira (CDU)
INQUÉRITO AOS CANDIDATOS DOS PARTIDOS COM ASSENTO PARLAMENTAR *
1 - As políticas do desporto na Europa devem aumentar, ou não, a distinção entre as atividades físicas de lazer face ao desporto profissional, harmonizando as legislações nacionais com diretivas específicas?
2 - No futebol, está de acordo com uma Liga dos Campeões fechada, com promoções e despromoções, ou em manter a relação das competições nacionais com as competições internacionais da UEFA, com qualificações pela via do desempenho nas provas domésticas?
3 - O Parlamento Europeu votou uma diretiva que garante maior proteção aos denunciantes (whistleblowers). Alargar o estatuto de denunciante a indivíduos que atuem fora das organizações denunciadas pode ser fundamental para as boas práticas desportivas e de gestão no que diz respeito à competição, como a corrupção e o match-fixing?
* Paulo Rangel, candidato do PSD, não mostrou disponibilidade para responder ao inquérito
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Pedro Marques - Candidato do PS
1 - Será difícil a criação de diretivas específicas para a área do desporto, atendendo à sua natureza, mas é possível garantir o respeito pelas especificidades das estruturas associativas, dos desportistas e demais entidades e agentes, quando se regulam matérias transversais como a livre circulação de pessoas e bens, a comercialização dos direitos televisivos, a regulação dos suplementos alimentares, as apostas ilegais, etc. As políticas que impactam no desporto devem contribuir não só para uma maior promoção da atividade física, mas também para a garantia da integridade do desporto profissional e de alto-rendimento.
2 - A participação das equipas nacionais nas provas Europeias deve estar indexada ao desempenho das mesmas nos campeonatos domésticos, numa lógica de garante da participação dos vários países, mantendo a relação das competições nacionais com as competições internacionais da UEFA.
3 - A posição já assumida pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista no Parlamento Europeu, que foi favorável à diretiva, é por mim subscrita. A Diretiva assegura a proteção a um conjunto alargado de pessoas que, em contexto relacionado com a sua atividade profissional, tenham conhecimento de factos que comprometam a integridade e o regular funcionamento do sistema.
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João Ferreira - Candidato da CDU
1 - Não colocamos em contradição o desporto de massas e o desporto de alto rendimento. Bem pelo contrário, embora constituindo expressões diferenciadas do desporto, consideramo-las como inter-relacionadas e complementares. O desporto de massas é base indispensável para se promover a preparação de atletas de alta competição. Uma política desportiva para o ser efetivamente deve ser definida e gerida soberanamente por cada país. Tal não significa que não se promova as necessárias trocas de experiências e cooperação na área desportiva ou que meios financeiros comunitários não devam ser utilizados como contributo para o necessário investimento público nacional no desporto.
2 - Considero que o que é adequado e correto é a manutenção da relação das competições nacionais com as competições internacionais, com qualificações pela via do desempenho nas provas em cada país, e não a criação de uma "liga" com carácter supranacional.
3 - A CDU defende o combate eficaz à corrupção com a adoção de medidas de reforço dos meios necessários. Entretanto a invocação desse objetivo não pode contribuir para a generalização de práticas que instituam a delação e a denúncia que, como se vê pela experiência de outros países, estão longe de contribuir seriamente para combater a corrupção e outras práticas ilícitas.
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Marisa Matias - Candidata do Bloco de Esquerda
1 - A distinção deve aumentar porque os problemas e instrumentos políticos são diferentes. As políticas públicas devem estar centradas no apoio à atividade física e ao desporto amador. No que diz respeito ao desporto profissional, o enfoque fundamental deve ser na transparência e no combate à corrupção.
2 - Somos contra qualquer modelo que promova a exclusão à partida de países das competições ao mais alto nível, bem como a concentração de recursos financeiros em poucos superclubes. Essa concentração, aliás, já está a acontecer no atual modelo e ameaça a competitividade de competições nacionais e europeias.
3 - Evidentemente, pode. Temos vários casos de denunciantes que divulgaram informação de interesse público, tanto em relação a offshores, como em relação aos grandes escritórios de advogados ou à prática desportiva. Essa informação deu azo a investigações porque revelava práticas que estão à margem da lei. Não podemos, por isso, continuar com um sistema que criminaliza as pessoas que providenciam essa informação tão relevante. Por isso, defendo que todos associados à libertação de informação não sejam criminalizados, sem prejuízo dos processos que digam respeito a outros crimes.
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Nuno Melo - Candidato do CDS
1 - A ação da UE no que se refere às políticas do desporto visa apoiar e complementar a ação dos estados-membros, respeitando as suas competências neste domínio, em linha com o princípio da subsidiariedade. Determinados desafios como a violência e intolerância no desporto, luta contra viciação de resultados, doping ou corrupção fazem parte do campo de ação da UE. Além disso, o desporto organizado e profissional, pela sua característica, designadamente, até pela ligação umbilical ao direito da concorrência, merece claramente uma maior atenção por parte do direito europeu.
2 - Não respondeu.
3 - A Diretiva dos "Whistleblowers" recentemente aprovada no Parlamento Europeu cria canais seguros para denúncias na área da corrupção e do matchfixing que, de outro modo, nunca seriam feitas. Para combater eficazmente a corrupção - e, no caso, irregularidades na indústria do futebol -, o estímulo ao mecanismo de denúncias pode revelar-se fundamental.
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Francisco Guerreiro - Candidato do PAN
1 - O desporto profissional representa uma componente muito específica do Desporto, englobando uma pequena porção da população com competências bastante especializadas. As doenças associadas à obesidade têm aumentado de forma galopante, sendo que é imperioso reforçar a aposta na atividade física para que os cidadãos possam viver um quotidiano cada vez mais saudável. No que concerne ao campo da harmonização, concordamos com legislações nacionais reforçadas e harmoniosas quando comparadas com os nossos pares, uma vez que é importante não ficar atrás dos países que apresentam as melhores práticas.
2 - Discordamos em absoluto de um formato de Liga dos Campeões fechada. Cada ano assistimos a surpresas que estimulam as ligas europeias. Campanhas fantásticas como as do Leicester em Inglaterra e Mónaco em França abrilhantam o futebol e o desporto. Vedar o acesso a competições internacionais alcançadas com bastante mérito e esforço seria uma injustiça incompreensível.
3 - Concordamos inteiramente com o alargamento do estatuto de denunciante a indivíduos que atuem fora das organizações denunciadas, uma vez que devem ser promovidas cada vez mais medidas que reforcem ou fomentem a transparência e a verdade desportiva. No programa do PAN às Eleições Europeias temos a seguinte proposta: "Reforçar as políticas europeias de proteção de denunciantes, garantindo em paralelo mecanismos de denúncia idóneos internos e externos."
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