A FPF criou uma equipa especial e abriu um processos de averiguações sobre outras denúncias em que em os visados não foram identificados. Sindicato dos Jogadores propôs medidas.
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O Conselho de Disciplina (CD) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) instaurou processos disciplinares a Miguel Afonso e Samuel Costa, treinador e diretor-desportivo da equipa feminina do Famalicão, respetivamente, na sequência de denúncias de comportamentos passíveis de configurar a prática de assédio sexual, ambos por troca de mensagens com jogadoras.
O caso do treinador já era conhecido, após notícia do jornal "Público" a dar conta de avanços do técnico quando estava no Rio Ave, e ontem o visado foi o diretor-desportivo dos famalicenses, que, à data dos relatos agora em avaliação, estava ao serviço do V. Guimarães. À SIC, Samuel Costa negou as acusações e prometeu avançar "até às últimas consequências."
Ainda antes de ser conhecido este último processo disciplinar da FPF, o presidente do Sindicato de Jogadores (SJ), Joaquim Evangelista, confirmara a O JOGO ter recebido, e encaminhado para as autoridades competentes, mais denúncias de jogadoras com relatos sobre o comportamento de outra pessoa que configurariam, também, a prática de assédio sexual, então sem nomear o visado.
Mas pode haver mais casos além destes agora conhecidos, porque a FPF abriu um processo de averiguações no âmbito de outros relatos em que não estão identificados os denunciados. Aliás, ciente de que a bola de neve pode ganhar outras dimensões nos próximos dias, o CD, soube-se ontem, criou uma equipa especial para garantir celeridade na instauração de processos específicos sobre suspeitas de assédio. Dessa equipa vão fazer parte membros do CD e da Comissão de Instrução Disciplinar.
Inquérito pode
durar 30 dias
Apesar da complexidade, o CD tem 30 dias, a contar da data de notificação, para decidir o desfecho do processo disciplinar instaurado a Miguel Afonso. Ou pelo menos o desfecho da suspensão aplicada. É essa a baliza temporal prevista nos regulamentos para as suspensões preventivas não automáticas (não renovável), formalidade acionada pela FPF, também ontem, para impedir o técnico de exercer funções, mas que, na prática, já estava assegurada pelo afastamento comunicado previamente pelo Famalicão.
Considerando que o CD abriu um processo disciplinar e não um mero processo de averiguações nos dois casos agora identificados, tal poderá indiciar que, além da notícia que esteve na origem de tudo, já estará, em princípio, na posse de outras fontes de avaliação. Os visados não são obrigados a comparecer ou a prestar depoimentos na fase de inquérito promovida pela instância desportiva. As vítimas, segundo garantia do SJ, estão interessadas em fazê-lo.
As quatro propostas do Sindicato
Não sendo inédito, o tema ganhou agora outro fôlego mediático. Além da equipa especial que o CD tem desde ontem, o assunto tem sido também debatido no grupo de trabalho para a igualdade de género criado na sequência do último Conselho Nacional do Desporto, tendo o SJ insistido em quatro medidas: a revisão da plataforma de denúncias, que deveria sair da esfera da FPF e passar para sede pública, isto de forma a garantir até maior controlo e ainda mais segurança a quem denuncia; a criação de protocolos de prevenção nos clubes, à imagem do que já existe em Espanha; a nomeação em cada clube de um agente de prevenção com formação técnica especializada e ainda a inclusão da temática do assédio nos cursos de formação de treinadores.
"É preciso deixar de normalizar estes comportamentos", sublinha Joaquim Evangelista, que diz a O JOGO não ter conhecimento de que casos de natureza idêntica aconteçam também no futebol masculino. Sem deixar de louvar o trabalho feito pela FPF na matéria, o presidente do SJ defende um agravamento das medidas punitivas. A última revisão do Regulamento de Disciplina da FPF, que entrou em vigor a 1 de julho, passou a integrar dois artigos específicos sobre assédio sexual, prevendo punições de três meses a um ano para comportamentos indesejados de carácter sexual, sob forma verbal, não verbal ou física. A pena agrava-se - sanções de três a cinco anos - caso haja a prática de ato sexual não consentido. À margem destas medidas disciplinares, no âmbito penal estão previstas sanções até um ano de prisão e, a nível laboral, o Código do Trabalho contempla a hipótese de indemnizações às vítimas.
Denunciar é, de resto, o caminho aconselhado pelo SJ, que promete apoio jurídico. A plataforma de denúncias da FPF, inicialmente criada a título de prevenção de irregularidades em casos de apostas desportivas/resultados combinados e depois alargada para discriminações/igualdade de género, continua ativa. As denúncias seguem para o CD, que, havendo matéria criminal, as reencaminha para a PJ e/ou Ministério Público.