
Antes de o treinador do Benfica ter subido à ribalta, João José era o JJ do desporto nacional, embora para um público mais reservado. Continua a ser conhecido apenas de uns quantos, embora seja o único voleibolista nacional com o título de campeão europeu, e logo como capitão do VfB Friedrichshafen, heptacampeão alemão
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João José descobriu o voleibol no desporto escolar. Podia ter passado ao lado de uma grande carreira, quando fez testes nalguns clubes de topo em Portugal e foi recusado. Não desistiu, insistiu e foi recompensado. Depois de uma passagem pela Madeira, aterrou no Castêlo da Maia, em ano de superequipa, que ganhou campeonato e Taça. Entre renovar e tentar a aventura no estrangeiro, optou pela segunda opção. Ou talvez única, pois só o VfB Friedrichshafen lhe fez uma proposta concreta. O resto é história: sete campeonatos e cinco taças da Alemanha, mais uma Liga dos Campeões de voleibol. Foi o único português a conquistar uma.
Nunca se arrependeu de ter emigrado e ficar tantos anos na Alemanha?
Não, de maneira nenhuma. Podia ter ficado no Castêlo da Maia ou procurar alguma coisa fora do país. A única oferta concreta foi a do VFB Friedricschafen e vim.
Como é o seu dia a dia?
É simples, de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Treinamos duas vezes por dia. A meio da semana temos meia folga, mas aproveito para passar tempo com a família.
A sua esposa é portuguesa?
Sim, madeirense. Casámos em 2003, ano em que fui para o Castêlo.
Ela aceitou bem a decisão de ir para a Alemanha?
Que remédio. Mas a ela custou um bocadinho a adaptação, por causa do clima e da língua, muito diferente e difícil. As primeiras duas épocas foram complicadas, porque passava muito tempo sozinha. Depois as coisas assentaram, já que, entretanto, nasceu o nosso filho Tiago, em 2006.
Ele é português ou alemão?
É português.
Fala as duas línguas?
Em casa, só português; na escola, fala alemão. Entende bem a língua, como um miúdo de seis anos. Não mistura as línguas e, em casa, só fala alemão nalguma brincadeira. Sabe bem separar as duas.
Já pensou no que vai fazer no próximo ano? Ou quando regressa a Portugal?
Não sei. Gostava de voltar a Portugal, mas ainda é uma incógnita. Também ainda não sei quanto mais tempo irei jogar e nem sei se quero ficar na Alemanha. Por isso, não ponho de parte voltar já a Portugal. Gostava. Mas se, por motivos profissionais, tiver de ficar, fico sem problemas.
Como é a vida em Friedrichshafen?
Tranquila. Esta é uma cidade pequena, situada no Sul da Alemanha, que faz fronteira com a Áustria e com a Suíça. Esta região não tem cidades grandes. É como a costa algarvia, com muitas cidades pequenas mas todas perto umas das outras. Tem 30 a 40 mil habitantes e fica a cerca de 700 quilómetros de Berlim. É uma cidade industrial, com muitas fábricas de peças automóveis, mas em que o desporto rei é o voleibol. Este é o clube que tem melhores resultados. O pavilhão leva cerca de quatro mil pessoas e temos uma média superior às duas mil por jogo.
As pessoas reconhecem-no na rua?
Sim, reconhecem. O voleibol tem bastante publicidade e também fazemos ações de promoção nas escolas duas ou três vezes por ano. Por isso, as pessoas conhecem-nos, olham, fazem um sorriso e desejam boa sorte.
Sente-se integrado?
Sinto. Como é desporto, temos mais facilidade. Sou mais acarinhado e mais bem recebido. Mas em Portugal sinto-me melhor, sem dúvida. A vantagem é que aqui há trabalho e é um país organizado. Em Portugal tenho a família, os amigos e sinto falta da praia, apesar de aqui ter um lago. Ao menos é água... A adaptação, para mim, não foi complicada. Vinha com vontade de jogar e treinar. O clube tem boas condições, é muito estável, profissional e com bons resultados.
Que faz nos tempos livres?
Não há muito tempo livre. Aproveito para descansar e estar com a família.
Há mais portugueses por aí?
Sim, mas são poucos. Brasileiros é que são muitos.
Do que tem mais saudades?
Da família. Os meus melhores amigos são da família, é do que sinto mais falta.
Quando acaba o contrato?
Este é o último ano.
Já lhe propuseram a renovação?
Já falámos, mas ainda não decidi. No voleibol, tudo se decide no final da temporada. A voltar para Portugal, seria para continuar a jogar e pensar mais à frente. Ser treinador seria complicado, porque teria de começar tudo de novo, mais as viagens, e eu quero estabilizar um pouco. Por isso, não sei ainda o que fazer.
Continuará na Seleção?
Estava a pensar retirar-me no último ano, por já estar com um grande cansaço psicológico. Mas falaram comigo e reconsiderei. Se me chamarem, volto.
Tirando os colegas da modalidade, conhecem-no em Portugal?
Em Portugal ninguém conhece ninguém sem ser no futebol. Há um fraco interesse das pessoas por outras modalidades. Sem ser no futebol, as pessoas não têm interesse. Eu até gosto de jogar futebol, mas não gosto de ver. É uma modalidade boa para se jogar mas não para ver.
Tem preferência por algum clube, mesmo assim?
Sou simpatizante do Benfica.
Mas nunca ninguém o reconheceu por cá?
Houve uma vez, numa festa, em Silves, em que duas pessoas me reconheceram e vieram falar comigo. Curiosamente, eram jogadores de futsal, mas a modalidade deles é um pouco diferente em termos de mentalidade.
Que portugueses de outras modalidades conhece que também joguem ao mais alto nível?
A Ticha Penicheiro no basquetebol e alguns dos praticantes de judo. Das coletivas não estou a ver mais...
Se não fosse jogador de voleibol, o que faria?
Não faço ideia. Quando comecei a jogar, estava a estudar eletrónica. Sempre gostei dessa área, de tecnologia. Mas, como deixei de estudar, parei no tempo.
