Corpo do artigo
Está tudo a correr mal. Portugal é eliminado pela Espanha. O Brasil é eliminado pela Holanda. É um luto. É um pesadelo, contrariando o Tratado de Tordesilhas. A melhor equipa africana - o Gana - foi eliminada, por penáltis, pela menos boa equipa sul-americana: o Uruguai.
Tanto a Espanha como a Holanda chatearam Portugal e o Brasil. Foram repudiados. Para sempre. Até agora. Até ontem. Contra todos os avisos do padre António Vieira contra o poderio da Holanda no Brasil, os holandeses conseguiram ganhar, no futebol, ao contrário do que aconteceu na História.
É um duplo luto. Chorámos por Portugal e ontem chorámos pelo Brasil. Nas palavras de António Carlos Jobim:
"Triste é saber/Que ninguém pode viver de ilusão,/Que nunca vai ser, nunca vai dar..."
É um bocado estranho ficar tudo entregue aos que falam castelhano. A partir de ontem devemos apoiar o menos ibérico e mais talentoso: a Argentina.
O raio da Europa picou-se. A Holanda resistiu e eliminou o Brasil. Hoje, a Alemanha está cheia de pica contra a Argentina, e a Espanha vai levar a sério o Paraguai.
Tudo isto nos leva a decidir se somos mais europeus (a favor da Holanda e da Espanha) ou sul-americanos-barra-não-europeus. Admitamos desde já que não é a Europa que defendemos. Se caíram Portugal e o Brasil, não é tanto pela Espanha ou pela Holanda (muito menos pela Alemanha) que devemos torcer: é pela Argentina. Que seja.
Ao examinar as nossas preferências, encontramos a identidade portuguesa. Os espanhóis e os holandeses foram nossos rivais poderosos no Brasil e no resto do mundo. Compreendemos assim que somos menos europeus do que latinos.
Foi durante o Uruguai-Gana que estes sentimentos mais se manifestaram. Em quem é que nós apostávamos mais contra a Holanda? Se a Holanda eliminou o Brasil, talvez o Gana tivesse mais hipóteses... quem sabe?
Aconteça o que acontecer, estou de luto pelo Brasil. Que pena. O Brasil merecia ter ganho o Mundial. Hoje em dia funciona uma inteligência estupidamente retroactiva em que se congratulam os vencedores numéricos e se culpam os perdedores.
Não sejamos escravos dos resultados. Vejamos os jogos - e joguemos o jogo. Hoje, às três da tarde, joga a Argentina contra a Alemanha. Tem de ganhar a Argentina
Logo, às sete e meia, é o Paraguai-Espanha. Mas nós, por muito que nos custe, temos de torcer pela vitória... da Espanha. O Paraguai é, por assim dizer, sul-americano de mais.
Não é fácil ser-se português neste momento. Mas é assim que deve ser. Seja a Argentina - antes que seja tarde de mais.
Luto
Chorámos por Portugal e ontem chorámos pelo Brasil. Nas palavras de António Carlos Jobim: "Triste é saber/Que ninguém pode viver de ilusão,/Que nunca vai ser, nunca vai dar..."
É um bocado estranho ficar tudo entregue aos que falam castelhano. A partir de ontem devemos apoiar o menos ibérico e mais talentoso