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Se puxássemos a fita poucos meses atrás, quem o diria? Valeu aos leões um despertar de Yannick Djaló na ponta final de mais uma corrida de pesadelo na Liga ZON Sagres para, perto da meta e através do pé direito do veloz atacante, a equipa chegar ao fim da prova e subir ao terceiro lugar do pódio após discussão directa em Braga com os senhores da casa. Na recta final, o avançado logrou, além do precioso auxílio ao colectivo, uma notoriedade individual que o torna em aposta prioritária para o novo Sporting de Duque, Freitas e Domingos, onde a escassez - para já - de extremos faz dele um bem precioso. Para mais, as suas características específicas - velocidade na transição e tendência para diagonais interiores a partir dos corredores laterais - encaixam perfeitamente no modelo que o novo técnico pretende implantar no leão. Importa, pois, saber a que se deve tão positiva transformação de Djaló.
A fechar mais uma estação decepcionante a nível global e pródiga em flutuações no plano particular, o camisola 20 do Sporting foi, contudo, protagonista de mais do que um mero acordar. Já com José Couceiro a suceder a Paulo Sérgio, o versátil dianteiro mostrou a sua melhor face. Calou apupos e silenciou assobios, sendo instrumental no alcance do mínimo dos mínimos para os verdes e brancos. Controlou os nervos, a forma física não o voltou a trair, as veias gelaram-se-lhe na cara do golo, e ele conquistou a total confiança do director que as circunstâncias fizeram assumir a equipa - foi sempre titular com Couceiro. A confirmar a rápida história de uma recuperação, o atacante rugiu mais alto na Pedreira. Mas como? O JOGO inquiriu diversos especialistas obtendo respostas que abrem perspectivas variadas. Impossível foi não tropeçar nos denominadores comuns que se seguem: confiança, valor ainda por explorar, uma versatilidade que pode ser má conselheira e a "urgência" de um atleta de 25 anos ainda a tentar assumir-se por completo.
"As mutações que o Yannick sofreu têm a ver, primeiro, com aspectos colectivos. Quando a equipa não está bem, isso reflecte-se sempre no rendimento individual." A afirmação introdutória pertence a Carlos Pereira, antigo lateral-esquerdo leonino e adjunto de Paulo Bento quando, há quase cinco anos, o hoje seleccionador nacional integrou o luso-guineense no plantel principal. Formando da Academia, Djaló regressava cotado de empréstimo com o rótulo de melhor marcador do terceiro escalão, proeza cometida em defesa do Casa Pia no primeiro ano como sénior. Mas o percurso do camisola 20 tem-se revelado errático desde então.
A culpa aqui até é da própria virtude, como completa Carlos Pereira: "O Yannick também sofreu um pouco com a questão do posicionamento. Ele precisa de espaço para exprimir o seu melhor, não é um jogador para actuar fixo na área. Não reúne esse tipo de características." Igual opinião tem Paulo Sérgio, absoluto crente nas capacidades de um jogador no qual apostou em 23 partidas, 18 delas no onze inicial. Isto na sequência de uma pré-época promissora. O passado recente foi prova disso, como sublinha o homem que comandou os leões até Fevereiro último: "O facto de a equipa não ter tido o sucesso esperado não o ajudou em termos individuais, por forma a que se destacasse e exprimisse todas as suas potencialidades, como é óbvio. Além disso, passou por azares com lesões. As nossas próprias dificuldades em formar o grupo levaram a que nos socorrêssemos da sua polivalência. Ele alinhou muito como extremo, embora, no meu entendimento, assente melhor no conjunto a jogar como segundo avançado."
Mas a confiança sentida é das condições que mais peso ganham. Carlos Pereira volta a enunciar exemplos, do plano mental aos rudimentos técnicos: "Quando foi primeira opção, se calhar sentiu sempre no subconsciente que no próximo jogo poderia não o ser, o que mexe sempre com a confiança do atleta, que é vital. A sua auto-estima fica fragilizada. Havia situações no jogo em que ele tinha dificuldade no simples domínio da bola, e esse não é um defeito do jogador, mas antes o reflexo da ansiedade e da pressão a que a equipa esteve especialmente sujeita nesta temporada. O Yannick não é uma parede onde a bola bate. Tem atributos técnicos."
Para o psicólogo Jorge Sequeira, não restam dúvidas sobre a importância do estado de alma, neste caso dividido em três partes: "Quando as pessoas sentem autoconfiança, confiança nos outros, transmitem a confiança para o exterior; são estes os três tipos de confiança aplicáveis a Djaló. A partir do momento em que o treinador lhe dá total confiança, isso faz com que a ansiedade diminua, fazendo, por consequência, que o jogador se sinta mais confortável perante o risco. Um ponta-de-lança corre riscos em situações de decisão que são especialmente visíveis, num remate, por exemplo."