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Numa altura em que se debatem as melhores maneiras de o futebol driblar a crise financeira mundial, a China tem surgido no panorama internacional como o mais recente El Dorado para jogadores que procuram salários milionários e uma pressão bem menor daquela que encontram nas ligas mais competitivas. Com uma taxa de crescimento económico que não baixou dos 10 por cento nos últimos anos, o gigante asiático tem todas as condições para ser um destino de sonho, mas ainda tem de resolver as enormes assimetrias existentes na liga. Jaime Pacheco, Nelo Vingada e Manuel Barbosa conhecem melhor do que ninguém a realidade do futebol chinês e explicaram a O JOGO os factores que fazem com que os salários milionários auferidos por Conca e Anelka sejam a excepção à regra de uma liga onde a principal aposta passa pela formação.
"O futebol chinês tem 20 anos de vida e ainda está numa fase embrionária. Podemos dizer que é uma criança a crescer. Há duas épocas, a liga fez um negócio milionário com um novo patrocinador e os milhões começaram a aparecer. Algumas equipas também foram compradas por grandes empresas e ganharam capacidade de contratar jogadores acima da média, criando um certo desequilíbrio de forças. Só uma elite é que tem capacidade para pagar salários milionários como os do Conca e do Anelka", explicou Jaime Pacheco, técnico do Beijing Guoan. Nelo Vingada, treinador do Dalian Shide, partilha da opinião do compatriota e acrescenta que a estratégia utilizada pelos chineses já deu mau resultado no Catar. "O valor do salário médio de um jogador estrangeiro está muito longe daquilo que é pago ao Conca. Quando estava a treinar no Catar eles também tinham a ideia de criar uma liga competitiva e muito atractiva para os melhores futebolistas do mundo, mas a aposta em craques em fim de carreira revelou-se desastrosa e temo que a China siga o mesmo caminho", alertou o português, acrescentando que os reforços vindos da Europa vão passar por dificuldades para singrar no futebol local. "Aqui a bola já não é quadrada e joga-se a alta velocidade", alerta o técnico.
Protagonista de uma carreira fulgurante no futebol chinês, Manuel Barbosa classifica os salários pagos a Conca e Anelka como "loucuras", mas revela que os altos valores reflectem a ambição de uma potência em crescimento que está ansiosa por ser a número um mundial a todos os níveis. "Independentemente do sistema político, aquilo que se vê é um país a crescer de dia para dia. Por todo o lado onde se passa vemos blocos de edifícios com 20 ou 30 andares a serem construídos nos sítios mais inacreditáveis. Os salários pagos aos jogadores são atraentes, mas os casos do Conca e do Anelka não reflectem a realidade. A chegada deles é benéfica para que apareçam mais patrocinadores. A aposta principal continua a ser na formação, mas estou curioso para ver o que vão dar estas loucuras", completou o ex-técnico das camadas jovens do Boavista.