É já esta segunda-feira, 6 de novembro, que o espetáculo da WWE passa por Lisboa, com as estrelas do wrestling americano a exibirem-se perante os fãs portugueses. Nas bancadas do Campo Pequeno vão estar outros lutadores, do pequeno mercado luso, mas com ambições de gigantes.
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Quando se fala em wrestling português, o nome de Tarzan Taborda vem à memória de muitos. O lutador natural de Penamacor, estabelecido na Fonte da Telha até 2005, ano em que morreu, fez carreira, no século passado, no mundo da luta, mas também do cinema. Alguns dos lutadores que hoje mantêm vivo o wrestling em Portugal ainda conviveram com o tal de Albano Taborda. "Em 2003 éramos três ou quatro e íamos todas as semanas até à Fonte da Telha, à casa do Tarzan, para treinar. Mas éramos autodidatas. Ele dava-nos o espaço, mas não era nosso treinador. Aparecia de vez em quando e dava umas dicas. Não era o ideal e sentimos que precisávamos de um espaço nosso, com um ringue." Bruno "Bammer" Brito, de 34 anos, foi um dos fundadores do Wrestling Portugal (WP), uma academia sediada em Queluz desde 2007. É também o treinador principal, um dos poucos certificados para ensinar a arte do wrestling. "Sempre tive o sonho de me tornar lutador e em 2007, depois de acabar a minha licenciatura em marketing, fui ao Canadá para tirar um curso na Storm Wrestling Academy, uma das escolas mais conceituadas." Aos 24 anos, Bruno dava asas ao sonho da luta e investia forte nessa ambição. "Só o curso custou 3000 euros. Com o alojamento e os voos, foi um investimento de cerca de seis mil euros."
Os ensinamentos aprendidos no Canadá, mas também a experiência adquirida com 10 anos de aulas e lutas, passa-os aos 15 lutadores que pertencem ao Wrestling Portugal, cujo campeão atual é Luís Salvador, também uma peça importante na divulgação na modalidade em Portugal. "Sou o autor do Wrestling.pt, um projeto pessoal que mantenho desde 2006 e que é um dos maiores sites de notícias em língua portuguesa, com fãs em Portugal e no Brasil." Este Mestre em Marketing Digital, de 27 anos, é apaixonado pelo wrestling desde os 15 anos e trabalhou quase uma década até alcançar o objetivo máximo de segurar o cinto da WP. "Comecei a treinar em 2008, quando o WWE estava muito na moda em Portugal. Não tenho um passado ligado à luta, apenas fiz natação e joguei futebol, mas nunca mais larguei a modalidade. Consegui atingir agora o meu maior objetivo que era tornar-me campeão. Não tenho maior objetivo dentro dos ringues. Agora só quero continuar a trabalhar para colocar o wrestling nacional no mapa.
Como se faz um campeão
Não é segredo que o wrestling é encenado. "É teatro desportivo", como Luís Salvador prefere chamá-lo. Mas quem decide, afinal, quem ganha? Como se faz um campeão? "Existe uma pessoa designada para gerir o espetáculo. É como o realizador de cinema. É alguém que não luta, mas conhece os lutadores, avalia as forças e fraquezas de cada um, monta os combates para que sejam um espetáculo para entreter o público. Determina quem vence e quem perde, tendo em conta o que o público quer que aconteça. Se um lutador ganha o apoio do público, se é consistente nos espetáculos, vai ter um papel de destaque para que depois possa lutar pelo título e até possa ganhá-lo. Depende também do balneário, se o lutador é respeitado, se tem atitude. É um trabalho de equipa, temos de dar destaque aos preferidos do público."
Luís é o campeão neste momento e ajuda-nos a perceber o que é preciso para conquistar o carinho das cerca de 150 pessoas que assistem aos combates do WP. "Um bom lutador tem de ter look de lutador. Aparência física, mas também uma personagem, carisma. E, claro, a técnica no ringue, saber como aplicar os golpes, sem esquecer o discurso. É preciso falar ao microfone, interagir com o público."
Neste último ponto, um dos especialistas é Ramon Vegas, alter ego de Henrique Neca, informático de 26 anos. O lutador, vestido num misto de Fidel Castro, mas com uniforme luso, é outro campeão, mas da APW. Ele é o anti-herói do wrestling em Portugal. "É a pessoa mais odiada dos espetáculos. É alguém que vai com a lição bem estudada e disposto a ganhar o combate, seja como for. Visto a personagem de corpo e alma. Quando estou na pele do Ramon sou uma pessoa odiável e isso dá-me um certo gozo. Posso fazer coisas que não faço no dia a dia. Tenho tido bastante sucesso com o público e não nos podemos esquecer de que os fãs fazem parte do espetáculo. Quanto mais interação, melhor. Estou ali para insultar e ser odiado", lembra Henrique que escolheu o nome numa mistura de dois dos lutadores de wrestling preferidos: Razor Ramon e Vinny Vegas.
Atores de alta competição
Apesar do carácter encenado, estes lutadores têm de dominar a técnica dos combates e das quedas. O treino ajuda a que tudo seja o mais seguro possível. "Aprendemos os movimentos, as combinações, aprende-se a cair como em qualquer outro desporto de combate", destaca o treinador Bruno Brito. Henrique Neca lembra os quilos que teve de perder até ficar em forma: "Nunca tinha feito desporto na vida. Pesava 110 quilos quando comecei no wrestling, em 2013. Sofri bastante. Temos de estar em boa forma física externa, mas também cardiovascular. A sessão de treino pode durar cinco horas e depois há o trabalho físico de cada lutador. Eu faço yoga, crossfit e treino cardio, tudo para aguentar o combate do início ao fim. Somos quase como atores, mas temos de ter capacidade física de um atleta de alta competição", sublinha.
Apesar do esforço dos lutadores, Portugal continua a ser um pequeno ponto no mapa do wrestling europeu, mas pode ser uma base para quem quiser voos mais altos. "Temos países como Inglaterra, Espanha, Alemanha ou Itália que são muito mais fortes na modalidade. Há já lutadores a viver do wrestling. Em Portugal somos amadores, mas fazemos o possível para tentar manter a modalidade viva e dar as bases a quem queira seguir o sonho lá fora", acrescenta o campeão Luís Salvador que não vai faltar ao espetáculo da WWE esta segunda-feira. Seis dias depois estará de novo no Centro Shotokai de Queluz onde, a 12 de novembro, defende o título em mais um "combate" do Wrestling Portugal.
Divisão geográfica e de visão
Apesar de o mercado ser pequeno, Portugal tem duas empresas a explorar o wrestling. O Wrestling Portugal (WP), de Bruno "Bammer" Brito, com sede em Queluz, e a Associação Portuguesa de Wrestling (APW), em Portimão. Para o treinador do WP, a união de marcas não faz sentido. "Temos visões diferentes e mais vale não misturar. Temos sinergias, trocamos lutadores, mas a união da marca não está nos planos, nunca esteve." Ramon Vegas é o campeão da APW, tendo surgido como rosto de uma marca que tenta renascer das cinzas. "É a associação mais antiga em Portugal, com mais de 20 anos, mas teve alguns problemas e está agora a renascer. Escolheram-me campeão e para ser a cara da APW. Sou de Lisboa e treino com o Wrestling Portugal, mas trocamos talentos."