"Anda, tu bates bem." Esta frase de Ronaldo, para João Moutinho, podia ser dirigida ao novo campeão mundial de "stick fighting". Militar da GNR, de 36 anos, faz parte do Corpo de Intervenção, mas sabe "desligar a ficha"
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Antes de mais, explique-nos o que é isto do "stick fighting".
Em Portugal é conhecida por "jogo do pau" e é a única arte marcial portuguesa. Nasceu no século XIV, por Nun"Álvares Pereira que, para treinar, substituiu as espadas de metal por madeira. Ao longo dos anos, deixou de ser para combate, mas sim para lazer. Tem duas variantes, do pau, a duas mãos, e a do bastão, só a uma mão, que é a que pratico.
Como se pontua?
O objetivo, tal como na esgrima, é tocar no adversário para fazer pontos. Mas neste caso não basta um toque, é preciso haver um impacto significativo e em qualquer parte do corpo. Sem restrições.
Quando começou a praticar?
No meu curso havia a cadeira do Jogo do Pau, nas matérias alternativas, mas modalidade ensinada era a duas mãos. Tenho formação em defesa pessoal e não via grande aplicação nessa variante para mim. Ninguém anda com uma vara de 1,2 metros no carro. Tive depois contacto com o mestre Nuno Russo que me mostrou a variante do bastão. Pouco tempo depois, fui o primeiro campeão nacional, em 2013, e tenho vencido desde então. Sou tetracampeão nacional.
E agora campeão do mundo.
Sim, foi a primeira vez que fui ao Mundial. O nível é bastante exigente e só agora me senti capaz de disputar medalhas, que era o meu objetivo. Já fui campeão europeu por duas vezes e senti que, como estou com 36 anos, ou era agora ou seria mais difícil chegar ao ouro mais tarde. Sou atleta da MMA, mas deixei de fazer outros desportos e dediquei-me no último ano ao "stick fighting" para ser campeão agora no Havai.
Qual a diferença entre o "jogo do pau" e o "stick fighting"?
O "jogo do pau" é português e evoluiu da base do combate de espada, ou seja, com uma base muito aberta e baixa, com um arranque muito lento. Para os combates em Portugal, como temos todos a mesma base, não é problema, mas na competição internacional a velocidade é muito maior. Tive depressa a noção de que o "jogo do pau" seria demasiado lento. Eficaz, ao nível da potência, mas lento. Tive então de criar algumas técnicas para ganhar velocidade. Nas Filipinas, por exemplo, este é um dos maiores desportos do país. Mas eles usam mais a pancada direta, mais fraca. Eu consegui criar um sistema híbrido, baseado no "jogo do pau", mas com correções para ser ainda mais rápido do que o sistema filipino. Assim, a minha pancada é mais valorizada, é mais rápida e tem mais impacto.
O Carlos é do Corpo de Intervenção da GNR. Utiliza estas técnicas em situações de tensão?
São realidades diferentes. Não posso bater com o bastão na cabeça de um cidadão, por muitos desacatos que ele esteja a causar. É proibido. Mas em competição é o ponto máximo. Tenho de desligar a ficha. Mal seria se não conseguisse distinguir a competição das minhas funções policiais. O meu papel na GNR, nos últimos anos, é dar formação aos agentes das unidades de intervenção, precisamente devido à minha base nas artes marciais.
Quantos praticantes temos em Portugal do "jogo do pau"?
Se tivermos 15 ou 20 atletas num campeonato nacional já é muito. Mas estamos a crescer. Neste momento, estou a formar campeões. Nas mulheres, as três primeiras são minhas alunas. Nos homens, fui campeão e o atleta que ficou em terceiro lugar também é meu aluno. Já estou no papel duplo, de competir e formar. Tenho um miúdo de 11 anos, que só sabia que jogava futebol, andebol, hóquei, etc., e que com meio ano de treino foi campeão nacional de juvenis.