Portugal tem dos melhores registos atacantes da prova, mas pela frente estará uma equipa matreira.
Se o famoso escritor George Orwell tinha razão e o futebol for "a continuação da guerra por outros meios", então aquilo que este sábado espera o reluzente e bem armado exército de Fernando Santos é um conflito pouco convencional, frente a um adversário que faz das táticas de guerrilha uma forma de arte.
Marrocos, ao contrário de Portugal, que impressiona pelo volume atacante, faz muito com pouco e é difícil causar danos à única seleção africana nos quartos de final do Mundial e que quer continuar a fazer história ao tornar-se a primeira daquele continente a jogar as "meias", depois de já ter sido pioneira na fase a eliminar - foi em 1986, quando portugueses e marroquinos se encontraram pela primeira vez num Campeonato do Mundo e estes levaram a melhor, por 3-1; no outro confronto, no Rússia"2018, também na fase de grupos, foi um golo de Cristiano Ronaldo a fazer a diferença no marcador, mas em campo o que se viu foi uma dura batalha, o mesmo cenário que se espera esta tarde no Estádio Al Thumama.
Ao cabo de uma semana surreal na Seleção, em que ao momento mais brilhante (goleada por 6-1 à Suíça, nos "oitavos") se seguiram polémicas ou pseudo-polémicas a envolver Ronaldo, explicações de Fernando Santos e, sobretudo, afirmações e reafirmações da inabalável união do grupo, agora de 24 jogadores, chega o momento de Portugal conquistar a terceira presença nas meias-finais, depois de 1966 e 2006.
Com todas as opções à disposição, o onze de Santos deverá ser o mesmo que arrasou os helvéticos, mantendo CR7 no banco e apostando em Gonçalo Ramos para liderar um ataque que é dos mais impressionantes dos que estão no Catar. Só a Inglaterra marcou os mesmos 12 golos da equipa das Quinas, que em termos de posse de bola (média de 51%) só perde para Argentina e para os mesmos ingleses (58% e 57%). Não se pode dizer que é uma posse estéril, mas quando a conversa é sobre eficácia, cuidado com os marroquinos!
A seleção de Walid Regragui é a menos batida do Mundial - sofreu apenas um... autogolo - e como se disse atrás, faz a festa com muito pouco: Hakimi e Ziyech, pela direita, e Boufal, na ala esquerda, são as setas que melhor executam o plano coletivo de resistir ao máximo e sair em rápidas e mortíferas investidas, como atesta uma eficácia de remate que quase duplica a portuguesa (23%-13%) ou o facto de lhes ter bastado um terço dos golos para estarem aqui... É grande a tentação de dizer que Dalot, Guerreiro e os alas à frente deles, na forma como taparem os caminhos para a baliza de Diogo Costa e ajudarem a abrir espaço rumo à de Bono, terão as chaves do encontro, até por ser pelas faixas que ambas as seleções atacam mais, mas não se pode menosprezar a luta a meio-campo, afinal, o coração de uma equipa.
Por um lado, porque os "artistas" lusos Bernardo, Bruno e até Félix gostam de se aventurar pelo centro; por outro, porque nem só de armamento se escreverá esta "guerra", será a equipa com o espírito mais forte e asas ligeiras que continuará a fazer história.